KARL MARX (1818-1883) E A ECONOMIA POLÍTICA.
POR: JEORGE CARDOZO*
“Os filósofos até o momento só fizeram intrepretar o mundo, o mais importante não fizeram, que é transformá-lo”.
TRAÇOS BIOGRÁFICOS
Economista, filósofo e socialista alemão, Karl Marx nasceu em Trier, Alemanha, a 5 de maio de 1818 e morreu em Londres, Inglaterra, a 14 de março de 1883. Estudou na Universidade de Berlim, principalmente a filosofia hegeliana, e formou-se em Iena, em 1841, com a tese Sobre as Diferenças da Filosofia da Natureza de Demócrito e de Epicuro. Em 1842 assumiu a chefia da redação do Jornal Renano em Colônia, onde seus artigos radical-democratas irritaram as autoridades. Em 1843, mudou-se para Paris, editando em 1844 o primeiro volume dos ANAIS GERMÂNICO-FRANCESES, órgão principal dos hegelianos da esquerda. Entretanto, rompeu logo com os líderes deste movimento, Bruno Bauer e Ruge.
Em 1844, conheceu em Paris Friedrich Engels, começo de uma amizade íntima durante a vida toda. Foi, no ano seguinte, expulso da França, radicando-se em Bruxelas e participando de organizações clandestinas de operários e exilados. Ao mesmo tempo em que na França estourou a revolução, em 24 de fevereiro de 1848, Marx e Engels publicaram o folheto o MANIFESTO COMUNISTA, primeiro esboço da teoria revolucionária que, mais tarde, seria chamada marxista. Voltou para Paris, mas assumiu logo a chefia do NOVO JORNAL RENANO em Colônia, primeiro jornal diário francamente socialista.
Depois da derrota de todos os movimentos revolucionários na Europa e o fechamento do jornal, cujos redatores foram denunciados e processados, Marx foi para Paris e daí expulso, para Londres, onde fixou residência. Em Londres, dedicou-se a vastos estudos econômicos e históricos, sendo frequentador assíduo da sala de leituras do BRISTISH MUSEUM. Escrevia artigos para jornais norte-americanos, sobre política exterior, mas sua situação material esteve sempre muito precária. Foi generosamente ajudado por Engels, que vivia em Manchester em boas condições financeiras.
Em 1864, Marx foi co-fundador da ASSOCIAÇÃO INTERNACIONAL DOS OPERÁRIOS, depois chamada I INTERNACIONAL, desempenhou dominante papel de direção. Em 1867 publicou o primeiro volume da sua obra principal, O CAPITAL. Dentro da I INTERNACIONAL encontrou Marx a oposição tenaz dos anarquistas, liderados por Bakunin, e em 1872, no CONGRESSO DE HAIA, a associação foi praticamente dissolvida. Em compensação, Marx podia patrocinar a fundação, em 1875, do PARTIDO SOCIAL-DEMOCRÁTICO alemão, que foi, porém, logo depois, proibido. Não viveu bastante para assistir às vitórias eleitorais deste partido e de outros agrupamentos socialistas da Europa.
PRIMEIROS TRABALHOS:
Entre os primeiros trabalhos de Marx, foi antigamente considerado como o mais importante o artigo SOBRE A CRÍTICA DA FILOSOFIA DO DIREITO DE HEGEL, em 1844, primeiro esboço da interpretação materialista da dialética hegeliana. Só em 1932 foram descobertos e editados em Moscou os MANUSCRITOS ECONÔMICO-FILOSÓFICOS, redigidos em 1844 e deixa-os inacabados. É o esboço de um socialismo humanista, que se preocupa principalmente com a alienação do homem; sobre a compatibilidade ou não deste humanismo com o marxismo posterior, a discussão não está encerrada. Em 1888 publicou Engels as TESES SOBRE FEUERBACH, redigidas por Marx em 1845, rejeitando o materialismo teórico e reivindicando uma filosofia que, em vez de só intrepretar o mundo, também o modificaria.
Marx e Engels escreveram juntos em 1845 A SAGRADA FAMÍLIA, contra o hegeliano Bruno Bauer e seus irmãos. Também foi obra comum A IDEOLOGIA ALEMÂ (1845-46), que por motivo de censura não pôde ser publicada (edição completa só em 1932); é a exposição da filosofia marxista. Marx sozinho escreveu A MISÉRIA DA FILOSOFIA (1847), a polêmica veemente contra o anarquista francês Proudhon. A última obra comum de Marx e Engels foi em 1847 O MANIFESTO COMUNISTA, breve resumo do materialismo histórico e apelo à revolução.
O 18 BRUMÁRIO DE LUÍS BONAPARTE foi publicado em 1852 em jornais e em 1869 como livros. È a primeira interpretação de um acontecimento histórico no caso o golpe de Estado de Napoleão III, pela teoria do materialismo histórico. Entre os escritos seguintes de Marx SOBRE A CRÍTICA DA ECONOMIA POLÍTICA em 1859 é, embora breve, também uma crítica da civilização moderna, escrito de transição entre o manuscrito de 1844 e as obras posteriores. A significação dessa posição só foi esclarecida pela publicação (em Moscou, 1939-41, e em Berlim, 1953) de mais uma obra inédita: ESBOÇO DE CRÍTICA DA ECONOMIA POLÍTICA, escritos em Londres entre 1851 e 1858 e depois deixados sem acabamento final.
Em 1867 publicou Marx o primeiro volume de sua obra mais importante: O CAPITAL. È um livro pricipalmente econômico, resultado dos estudos no BRISTISH MUSEUM, trantando da teoria do valor, da MAIS-VALIA, da acumulação do capital etc. Marx reuniu documentação imensa para continuar esse volume, mas não chegou a publicá-lo. Os volumes II e III de O CAPITAL foram editados por Engels, em 1885 e em 1894. Outros textos foram publicados por Karl Kautsky como volume IV (1904-10).
A FILOSOFIA DE MARX
MATERIALISMO DIALÉTICO
A CIÊNCIA – “Nós conhecemos somente uma única ciência; a ciência da história”. Ou seja, o materislismo dialético. O fio condutor segundo Marx, para o estudo da história são as idéias Jurídicas, morais, Filosófica, Religiosa e etc.. Dependem: são condicionadas ou são o reflexo e a justificação da estrutura econômica, de modo que, se muda a estrutura econômica, há transformações correspondentes na superestrutura ideológica.
Baseado em Demócrito e Epicuro sobre o materialismo e em Heráclito sobre a dialética (do grego, DOIS LOGOS, duas opiniões divergentes), Marx defende o materialismo dialético, tentando superar o pensamento de Hegel e Feuerbach.
IDÉIAS E PRÁXIS – “a concepção que devemos ter não é a de explicar a práxis a partir das idéias, mas de explicar as formações ideológicas a partir da práxis material”.
A dialética hegeliana era a dialética do idealismo (doutrina filosófica que nega a realidade individual das coisas distintats do “EU” e só lhes admite a idéia), e a dialética do materialismo é posição filosófica que considera a matéria como à única realidade e que nega a existência da alma, de outra vida e de Deus. Ambas sustentam que realidade e pensamento é a mesma coisa: as leis do pensamento são as leis da realidade. A realidade é contraditória, mas a contradição supera-se na síntese que é a “verdade” dos momentos superados.
A VERDADE – para Marx, “a práxi é o conceito de verdade, condicionada com a emperia que levará à luta de classes. Sendo esta a dialética da história que levará a verdade na ciência da história”.
Hegel considerava ontologicamente (do grego onto + logos; parte da metafísica, que estuda o ser em geral e suas propriedades transcidentais) a contradição (antítese) e a superação (síntese); Marx considerava historicamente como contradição de classes vinculada a certo tipo de organização social. Hegel apresentava uma filosofia que procurava demonstrar a perfeição do que existia (divinização da estrutura vigente); Marx apresentava uma filosofia revolucionária que procurava demonstrar as contradições internas da sociedade de classes a as exigências de superação.
Ludwig Feuerbach procurou introduzir a dialética materialista, combatendo a doutrina hegeliana, que, a par de seus métodos revolucionários concluía eminentemente conservadora. Da crítica à dialética idealista, partiu Feuerbach à crítica da Religião e da essência do cristianismo.
Feuerbach pretendia trazer a religião do céu para a terra. Ao invés de haver Deus criado o homem à sua imagem e semelhança, foi o homem quem criou Deus à sua imagem. Seu objetivo era conservar intactos os valores morais em uma religião da humanidade, na qual o homem seria Deus para o homem.
PRODUÇÃO DE IDÉIAS – “Está relacionada com a atividade material e a troca deste material entre os homens como exemplo a linguagem da vida real”.
Adotando a dialética hegeliana, Marx, rejeita como Feuerbach, o idealismo, mas, ao contrário, não procura preservar os valores do cristianismo. Se Hegel tinha identificado, no dizer de Radbruch, O SER E O DEVER-SER (o SEN e o SOLENE) encarando a realidade como um desenvolvimento da razão e vendo no DEVER-SER o aspecto determinante e no SER o aspecto determinado dessa unidade.
A dialética marxista postula que as leis do pensamento correspondem às leis da realidade. A dialética não é só pensamento: é pensamento e realidade a um só tempo. Mas, a matéria e seu conteúdo histórico ditam a dialética do marxismo: a realidade é contraditória com o pensamento dialético. A contradição dialética não é apenas contradição externa, mas unidades das contradições, identidade:
“a dialética é ciência que mostra como as cntradições podem ser concretamente (isto é, VIR-A-SER) idênticas, como passam uma na outra, mostrando também porque a razão não deve tomar essas contradições como coisas mortas, petrificadas, mas como coisas vivas, móveis, lutando uma contra a outra em e através de sua luta.” (Henri Lefebvre, Lógica formal/Lógica dialética, trad. Carlos N. Coutinho, 1979, p. 192).
Os momentos contraditários são situados na história com sua parcela de verdade, mas também de erro; não se misturam, mas o conteúdo, considerado como unilateral é recaptado e elevado a nível superior.
VIDA E CONSCIÊNCIA – “não é a consciência que detrmina a vida, mas a vida que detrmina a consciência”.
Marx acusou Feuerbach, afirmando que seu humanismo e sua dialética eram estáticos: o homem de feuerbach não tem dimensões, está fora da sociedade e da história, é pura abstração. É indispensável segundo Marx, compreender a realidade histórica em suas contradições, para tentar superá-las dialeticamente. A dialética apregoa os seguintes princípios: tudo se relaciona (lei da ação recípoca e da conexão universal); tudo se transforma (Lei da transformação universal e do desenvolvimento incessante); as mudanças qualitativas são consequências de revoluções quantitativas; a contradição é interna, mas os contrários se unem num momento posterior: a luta dos contrários é o motor do pensamento e da realidade; a materialidade do mundo; a anterioridade da matéria em relação à consciência; a vida espiritual da sociedade como reflexo da vida material.
O materialismo dialético é uma constante no pensamento do marxismo-leninismo (surgido como superação do capitalismo, socialismo, ultrapassando os ensinamentos pioneiros de Feuerbach).
MATERIALISMO HISTÓRICO
O MATERIALISMO – é, para Marx, “o primeiro pressuposto de toda a existência humana e, portanto, de toda a história, é que os homens devem estar em condições de viver para poder “fazer história”. Mas, para viver é preciso antes de tudo comer, beber, ter habitação, vestir-se, educar e etc. Portanto, a produção dos meios que permitam a sastisfação dessas necessidades, a produção da própria vida material”.
Na teoria marxista, o materialismo histórico pretende a explicação da história das sociedades humanas, em todas as épocas, através dos fatos materiais, essencialmente econômicos e técnicos. A sociedade é comparada a um edifício no qual as fundações, a infra-estrutura, seriam representadas pelas forças econômicas, enquanto o edifício em si, a superestrutura, representaria as idéias, costumes, instituições (políticas, religiosas, jurídicas, etc). A propósito, Marx escreveu, na obra A MISÉRIA DA FILOSOFIA (1847) na qual estabelece polêmica com Proudhon:
“As relações sociais são inteiramente interligadas às forças produtivas. Adquirindo novas forças produtivas, os homens modificam o seu modo de produção, a maneira de ganhar a vida, modificam todas as relações sociais. O moinho a braço vos dará a sociedade com o suserano; o moinho a vapor, a sociedade com o capitalismo industrial”.
Tal afrimação, defendendo rigoroso determinismo econômico em todas as sociedades humanas, foi estabelecida por Marx e Engels dentro do permanente clima de polêmica que mantiveram com seus opositores, e atenuada com a afimativa de que existe constante interação e interdependência entre os dois níveis que compõe a estrutura social: da mesma maneira pela qual a infra-estrutura atua sobre a superestrutura, sobre os reflexos desta, embora, em última instância, sejam os fatores econômicos as condições finalmente determinantes.
EXISTENCIALISMO
ESSÊNCIA DE HOMEM – “é a força de produção de capital, as formas sociais e intercâmbio é o fundamento real que os filósofos representaram como substância”.
“O que Marx mais crítica é a questão de como compreender o que é o homem. Não é o ter consciência (ser racional), nem tampouco ser um animal político, que confere ao homem sua singularidade, mas ser capaz de produzir suas condições de existência, tanto material quanto ideal, que diferencia o homem”.
A essência do homem é não ter essência, a essência do homem é algo que ele próprio constrói, ou seja, a história. “A existência precede a essência; nenhum ser humano nasce pronto, mas o homem é, em sua essência, produto do meio em que vive que é construído a partir de suas relações sociais em que cada pessoa se encontra. Assim como o homem produz o seu próprio ambiente, por outo lado, esta produção da condição de existência não é livremente escolhida, mas sim, previamente determinada. O Homem pode fazer a sua História, mas não pode fazer nas condições por ele escolhidas. O homem é historicamente determinado pelas condições, logo é responsável por todos os seus atos, pois ele é livre para escolher. Logo todas as teorias de Marx estão fundamentadas naquilo que é o homem, ou seja, o que é a sua existência. O HOMEM É CONDENADO A SER LIVRE.
REALIDADE EMPÍRICA – ESPECULAÇÃO – “é a conexão entre a estrutura social e política e a produção de forma empírica e sem especulação”.
As relações sociais do homem são tidas pelas relações que o homem mantém com a natureza, onde desenvolve suas práticas, ou seja, o homem se constitui a partir de seu próprio trabalho, e sua sociedade se constitui a partir de suas condições materiais de produção, que dependem de fatores naturais (clima, biologia, geografia...), ou seja, relação homem-Natureza, assim como da divisão social do trabalho, sua cultura. Logo, também há a relação homem-Natureza-Cultura.
POLÍTICA E ECONOMIA
A ESTRUTURA – “é a produção da vida, tanto da própria, no trabalho, como da Autéia, na procriação aparece agora como dupla relação: natural e social. Inserido nisso, o modo de produção, as fases industrial, todos ligados por determinados modos de cooperação e uma determinada fase social tornando-se uma ‘força produtiva’, que somadas, condicionam o Estado social. Consequentemente, a ‘história da humanidade’ deva ser estudada e elaborada em conexão com a história da indústria e das trocas”.
Se analisarmos o contexto histórico do homem, nos promórdios, perceberemos que havia um espírito de coletivismo: todos compartilhavam da mesma terra, não havia propriedade privada; até a caça era compartilhada por todos. As pessoas que estavam inseridas nesta comunidade sempre se preocupavam umas com as outras, em prover as necessidades uns dos outros. Mas com passar do tempo, o homem, com suas descobertas territoriais, acabou tornando inevitáveis as colonizações e, portanto, o escravismo, por causa de sua ambição. O escravo servia excluisivamente ao seu senhor, produzia para ele e o seu viver era em função dele.
O coletivismo dos índios acabou; e o escravismo se transformou numa relação: agora o escravo trabalhava menos para seu senhor, e por seu trabalho conquistava um pedaço de terra para sua subsistência, ou seja, o servo trabalhava dias da semana para seu senhor e outros para si. Esta relação servo-senhor feudal funcionou durante certo período na história da humanidade, mas, por causa de uma série de fatores e acontecimentos, entre eles o aumento populacional, as condições de comércio (surgia a chance de o servo obter capital através de sua produção excessiva), o capitalismo mercantilista, o feudalismo decaiu; e assim, deu espaço a um novo sistema econômico: o capitalismo industrial ( que teve seu desenvolvimento por culminar durante a revolução industrial, com surgimento da classe proletária). Assim, deve-se citar a economia inglesa como ponto de partida para as teorias marxistas.
Como todo sistema tem seu período de crise, ocasionando uma necessidade de mudança, Adam Smith (o primeiro a incorporar ao trabalho a idéia de riqueza) desenvolve o liberalismo econômico.
O RESULTADO DO CONTRASTE: É A REVOLUÇÂO – “a subversão das forças produtivas existentes e a formação de uma massa revolucionária que se revolte, não só contra as condições particulares da sociedade existente até então, mas também contra a própria produção da vida vigente”.
Do Latim Liberalis, que significa benfeitor, generoso, tem seu sentido político em oposição ao absolutismo monárquico. Os seus principais ideais eram: o Estado devia obedecer ao princípio da separação de poderes (executivo legislativo e judiciário); o regime seria representativo e parlamentar; o Estado se submetia ao direito, que garantiria aos indivíduos direitos e liberdades inalienáveis, especialmente o direito de propriedades. E foi isto que fez com que cada sistema fosse modificado.
Sobretudo também se deve mencionar David Ricardo, que, mais interessado no estudo da distribuição do que produção das riquezas estabeleceu, com base em Malthus, a lei da renda fundiária (agrária), segundo a qual os produtos das terras fértis são produzidos a custo menor, mas vendidos ao mesmo preço dos demais, propiciando a seus proprietários uma renda fundiária igual à diferença dos custos de produção. A partir da teoria da renda fundária, Ricardo elaborou a lei do preço natural dos salários, sempre regulada pelo preço da alimentação, vestuário e outros itens indispensáveis à manutenção do operário e seus dependentes.
Pois, como foi dito anteriormente, com a Revolução Industrial surgiu a classe do proletariado.
A LUTA DE CLASSES (MOTOR DA HISTÓRIA
MOTOR DA HISTÓRIA – “a força motriz da história não é a crítica e sim a revolução, ou seja, a luta de classe”.
Pretendendo caracterizar não apenas uma visão econômica da história, mas também uma visão histórica da economia, a teoria marxista também procura explicar a evolução das relações econômicas nas sociedades humanas ao longo do processo histórico. Haveria, segundo a concepção marxista, uma permanente dialética das forças entre poderosos e fracos, opressores e oprimidos, a história da humanidade seria constituída por uma permanente luta de classes, como deixa bem claro a primeira frase do primeiro capítulo d’ O MANIFESTO COMUNISTA:
A história de toda sociedade passado é a história da luta de classes.
A SUPERESTRUTURA – “é o fio condutor para o estudo da história são as idéias jurídicas, morais, filosóficas, religiosas etc., que são condicionadas e o reflexo e justificação da estrutura econômica, entretanto, se muda a estrutura econômica, também mudará a superestrutura ideológica”.
Classes essas que, para Engels são “os produtos das relações econômicas de sua época”. Assim apesar das diversidades aparentes, escravidão, servidão e capitalismo seriam essencialmente etapas sucessivas de um processo único. A base da sociedade é a produção econômica. Sobre esta base econômica se ergue uma superestrutura, um estado e as idéais econômicas, sociais, políticas, morais, filosóficas e artísticas. Marx queria a inversão da pirâmide social, ou seja, pondo no poder a maioria, os proletários, que seria a única força capaz de destruir a sociedade capitalista e construir uma nova sociedade, socialista.
A IDEOLOGIA – “está presente no representar, no pensar, na troca espiritual, nas idéias, na superestrutura, na linguagem, no direito, na política, na religião, na arte. Todas relacionadas com a estrutura econômica e com o modo de produção. Com efeito, para Marx, o Estado ‘nada mais é do que a forma de organização que os burgueses criaram por necessidade, a fim de garantir reciprocamente suas propriedades e seus interesses”.
Para Marx os trabalhadores estariam dominados pela ideologia da classe dominante, ou seja, as idéias que eles têm do mundo e da sociedade seriam as mesmas idéias que a burguesia espalha. O capitalismo seria atingido por crises econômicas porque ele se tornou o impedimento para o desenvolvimento das forças produtivas. Seria um absurdo que a humanidade inteira dedica-se a trabalhar e a produzir subordinada a um punhado de grandes empresários. A economia do futuro que associaria todos os homens e povos do planeta, só poderia ser uma produção controlada por todos os homens e povos. Para Marx, quanto mais o mundo se unifica economicamente mais ele necessita de socialismo.
LUTAS DE CALSSES – “a história de toda a sociedade que existiu até o momento é a história da luta de classe; livre e escravo, patrícios e plebeus; barões e servos da gleba, membros das corporações e aprendizes, em suma, para Marx, estiveram continuamente em mútuo contraste e travaram lutas que acabou em transformação revolucionária de toda a sociedade”.
Não basta existir uma crise econômica para que haja uma revolução. O que é decisivo são as ações das classes sociais que, para Marx e Engels, em todas as sociedades em que a propriedade é privada existem lutas de classes (senhores + escravos, nobres feudais + servos, burgueses + proletariados). A luta do proletariado do capitalismo não deveria se limitar à luta ideológica para que o socialismo fosse conhecido pelos trabalhadores e assumido como luta política pela tomada do poder. Neste campo, o proletariado deveria contar com uma arma fundamental, o partido político, o partido político revolucionário que tivesse uma estrutura democrática e que buscasse educar os trabalhadores e levá-los a se organizar para tomar o poder por meio de uma revolução socialista.
A MAIS-VALIA – “está condicionada ao lucro, de modo que a produção terá uma margem de lucro correspondente. Sendo que este lucro será sempre maior que o valor aplicado na sua produção”.
Marx tentou demostrar que no capitalismo sempre haveria injustiça social, e que o único jeito de uma pessoa ficar rica e ampliar sua fortuna seria explorando os trabalhadores, ou seja, o capitalismo, de acordo com Marx é selvagem, pois o operário produz mais para o seu patrão do que o seu próprio custo para a sociedade, e o capitalismo se apresenta necessariariamente como um regime econômico de exploração, sendo a MAIS-VALIA a lei fundamental do sistema.
A força vendida pelo operário ao patrão vai ser utlizada não durante 6 horas, mas durante 8, 10, 12 ou mais horas. A mais-valia é constituída pela diferença entre o preço pelo qual o empresário compra a força de trabalho (6 horas) e o preço pelo qual ele vende o resultado (10 horas, por exemplo).
É quando o operário ao criar algo fora de si, o operário ALIENAÇÂO – “o processo de alienação se dá q se nega no objeto criado. É o processo de objetificação. Por isso, o trabalho que é alienado (porque cria algo alheio ao sujeito criador) permanece alienado até que o valor nele incorporado pela força de trabalho seja apropriado intregalmente pelo trabalhador”.
Desse modo, quanto menor o preço pago ao operário e quanto maior a duração da jornada de trabalho, tanto maior o lucro empresarial. No capitalismo moderno, com a redução progressiva da jornada de trabalho, o lucro empresarial seria sustentado através do que se denomina mais-valia relativa (em oposição à primeira forma, chamada mais-valia absoluta), que consiste em aumentar a produtividade do trabalho, através da racionalização e aperfeiçoamento tecnológico, mas ainda assim não dixa de ser o sistema semi-escravista, pois “o operário cada vez se emprobece mais quando produz mais riquezas”. Assim, quanto mais o mundo das coisas aumenta de valor, mais o mundo dos homens se desvaloriza. Ocorre então a ALIENAÇÂO, já que todo trabalho é alienado, na medida em que se manifesta como produção de um objeto que é alheio ao sujeito criador. O raciocínio de Marx é muito simples: ao criar algo fora de si, o operário se nega no objeto criado. É o processo de OBJETIFICAÇÂO. Por isso, o trabalho que é alienado (porque cria algo alheio ao sujeito criador) permanece alienado até que o valor nele incorporado pela força de trabalho seja apropriado integralmente pelo trabalhador. Em outras palavras, a produção representa uma negação, já que o objeto se opõe ao sujeito e o nega na medida em que o pressupõe e até o define. A apropriação do valor incorporado ao objeto graças à força de trabalho do sujeito-produtor promove a negação da negação. Ora seja, a partir do momento que o sujeito-produtor dá valor ao que produziu, ele já não está mais alienado.
CONCEITOS:
CAPITALISMO, SOCIALISMO, COMUNISMO E ANARQUISMO.
O CAPITALISMO tem seu início na Europa. Suas características aparecem desde a baixa idade média (do século XI ao XV) com a transferência do centro da vida econômica social e política dos feudos para a cidade. O feudalismo passava por uma grave crise decorrente da catástrofe demográfica causada pela Peste Negra que dizimou 40% da população européia e pela fome que assolava o povo. Já com o comércio reativado pelas Cruzadas (do século XI ao XII), a Europa passou por um intenso desenvolvimento urbano e comercial e, consequentemente, as relações de produção capitalistas se multiplicaram, minando as bases do feudalismo. Na Idade Moderna, os reis expandem seu poderio econômico e político atráves do mercantilismo e do absolutismo. Dentre os defensores deste temos os filósofos Jean Bodin (“os reis tinham o direito de impor leis aos súditos sem o consentimento deles”), Jacques Bossuet (“o rei está no trono por vontade de Deus”) e Niccólo Machiavelli (“a unidade política é fundamental para a grandeza de uma nação”).
Com o absolutismo e com o mercantilismo o Estado passava a contolar a economia e a buscar colônias para adquirir metais (metalismo) através da exploração. Isso para garantir o enriquecimento da metrópole. Esse enriquecimento favorece a burguesia – classe que detém os meios de produção – que passa a contestar o poder do rei, resultando na crise do sistema absolutista. E com as revoluções burguesas, como a Revolução Francesa e a Revolução Inglesa, estava garantido o triunfo do capitalismo.
A partir da segunda metade do século XVIII, com a Revolução Industrial, inicia-se um processo initerrupto de produção coletiva em massa, geração de lucro e acúmulo de capital. Na Europa Ocidental, a burguesia assume o controle econômico e político. As sociedades vão superando os tradicionais critérios da aristocracia (pricipalmente a do privilégio de nascimento) e a força do capital se impõem. Surgem as primeiras teorias econômicas: a fisiocracia e o liberalismo. Na Inglaterra, o escocês Adam Smith (1723-1790), percursor do Liberalismo econômico, publica UMA INVESTIGAÇÂO SOBRE NATUREZAS E CAUSAS DA RIQUEZA DAS NAÇÔES, em que defende a livre-iniciativa e a não-inteferência do Estado na economia.
Deste ponto, para tal realidade econômica, pequenas mudanças estruturais ocorreram em nosso fúnebre sistema capitalista.
SOCIALISMO – A História das Idéias Socialistas possui alguns cortes de importância. O peimeiro deles é entre os socialistas Utópicos e os socialistas Científicos, marcado pela introdução das idéais de Marx e Engels no universo das propostas de construção da nova sociedade. O avanço das idéias marxistas consegue dar maior homogeneidade ao movimento socialista internacional.
Pela primeira vez, trabalhadores de países diferentes, quando pensavam em socialismo, estavam pensando numa mesma sociedade – aquela preconizada por Marx – e numa mesma maneira de chegar ao poder.
COMUNISMO – As idéias básicas de Karl Marx estão expressas principalmente no livro O CAPITAL e n’ O MANIFESTO COMUNISTA, obra que escreveu com Friedrich Engels, economista alemão. Marx acriditava que a única forma de alcançar uma sociedade feliz e harmoniosa seria com os trabalhadores no poder. Em parte, suas idéias eram uma reação às duras condições de vida dos trabalhadores no séculoXIX, na França, na Inglaterra e na Alemanha. Os trabalhadores das fábricas e das minas eram mal pagos e tinham de trabalhar muitas horas sob condições desumanas.
Marx estava convencido que a vitória do comunismo era inevitável. Afirmava que a história segue certas leis imutáveis, à medida que avança de um estágio a outro. Cada estágio caracteriza-se por lutas que conduzem a um estágio superior de desenvolvimento. O comunismo, segundo Marx, é o último e mais alto estágio de desenvolvimento.
Para Marx, a chave para a compreensão dos estágios do desenvolvimento é a relação entre as diferentes classes de indivíduos na produção de bens. Afirmava que o dono da riqueza é a classe dirigente porque usa o poder econômico e político para impor sua vontade ao povo. Para ele, a luta de classes é o meio pelo qual a história progride. Marx achava que a classe dirigente jamais iria abrir mão do poder por livre e espotânea vontade e que, assim, a luta e a violência eram inevitáveis.
O ANARQUISMO foi a proposta revolucionária internacional mais importante do mundo durante a segunda metade do século XIX, quando foi sustituído pelo marxismo (comunismo). Em suma, o anarquismo prega o fim do Estado e de toda e qualquer forma de governo, que seriam as causas da existência dos males sociais, que devem ser substituído por uma sociedade em que os homens são livres, sem leis, polícia, tribunais ou forças armadas. A sociedade anarquista seria organizada de acordo com a necessidade das comunidades, cujas relações seriam voltadas ao auto-abastecimento sem fins lucrativos e à base de trocas. A doutrina, que teve em Bukanin seu grande expoente teórico, organizou-se primeiramente na Rússia, expandindo-se depois para o resto da Europa e também para os Estados Unidos. O auge de sua propagação deu-se no final do século XIX, quando agregou-se ao movimento sindical, dando origem ao anarco-sindicalismo, que pregava que os sindicatos eram os verdadeiros agentes das transformações sociais. Com o surgimento do marxismo, entretanto, uma proposta revolucionária mais adequada ao quadro social vigente no século XX, o anarquismo entrou em decadência. Sem, contudo, deixar de ter tido sua importância histórica, como no episódio em que os anarquistas italianos Nicola Sacco e Bartolomeo Vanzetti foram executados por assassinato em 1921, nos Estados Unidos, mesmo com as inúmeras evidências e testemunhos que provavam sua incência.
REVISIONISMO
Depois da morte de Marx e Engels, a rápida industrialização da Alemanha e o fortalecimento do partido social-democrata e dos sindicatos melhoraram muito as condições de vida dos trabalhadores alemães, ao mesmo tempo em que se tornou cada vez mais distante a esperada crise fatal do regime capitalista. Eduard Bernstein em seu livro OS PRESSUPOSTOS DO SOCIALISMO E AS TAREFAS DA SOCIAL_DEMCRACIA recomendaram abandonar utópicas esperanças revolucionárias e contentar-se, realisticamente com o fortalecimento do poder político e econômico das organizações do proletariado, considerando-se que as previsões marxistas de depauperamento progressivo (esgotar as forças de forma a tornar-se muito pobre) das massas não se tinham verificado.
Esse “revisionismo” de Bernstein foi combatido pela ortodoxia marxista, representada por Karl kautsky. Mas praticamente o revisionismo venceu de tal maneira, que a social-democracia alemã abandonou, enfim, o marxismo.
Ficou isolada a marxista Rosa Luxemburg, que em uma de suas obras adaptou a teoria de Marx às novas condições do imperialismo econômico e político do século XX.
NEOMARXISTAS: Fora da Rússia, houve e há várias tentativas de dar ao marxismo outra base filosófica que o materialismo científico do século XIX, que já não se afigura bastante sólido a muitos marxistas modernos. Georges Sorel apoiando-se na filosofia do ÉLAN VITAL de Henri Bergson postulou um movimento antiparlamentar, de violência revolucionária, inspirado pelo “mito” de uma irrestível greve geral.
O MANIFESTO COMUNISTA
O MANIFESTO COMUNISTA fez a humanidade caminhar. Não em direção ao paraíso, mas na busca (raramente bem sucedida, até agora) da solução de problemas como a miséria e a exploração do trabalho. Rumo à concretização do prinípio, teoricamente aceito há 200 anos, diz que “todos os homens são iguais”. E sublinhando a novidade que afirmava que os pobres, os pequenos, os explorados também podem ser sujeitos de suas vidas.
Por isso é um documento histórico, testemunho da rebeldia do ser humano. Seu texto, racional, aqui e ali bombástico e, em diversas passagens irônicas, mal esconde essa origem comum com homens e mulheres de outros tempos: o fogo que acendeu a paixão da Liga dos Comunistas, reunida em Londres no ano de 1847, não foi diferente do que incendiou corações e mentes na luta contra todas as formas de opressão.
A Liga dos Comunistas encomendou a Marx e a Engels a elaboração de um texto que tornasse claros os objetivos dela e sua maneira de ver o mundo. E isto foi feito pelos dois jovens, um de 30 e o outro de 28 anos. Portanto, o MANIFESTO COMUNISTA é um conjunto afirmativo de idéias, de “verdades” em que os revolucionários da època e de hoje acreditam, por conterem, segundo eles, elementos científicos – um tanto economicistas – para a compreensão das transformações sociais. Nesse sentido, o MANIFESTO é mais um monumento do que um documento... Pétreo, determinante, forte: letras, palavras e frases que queriam Ter o poder de uma arma para mudar o mundo, colocando no lugar “da velha sociedade burguesa uma associação na qual o livre desenvolvimento de cada membro é a condição para o desenvolvimento de todos”.
O MANIFESTO tem uma estrutura simples: uma breve introdução, três capítulos e uma rápida conclusão.
A INTRODUÇÂO fala com certo orgulho, do medo que o comunismo causa nos conservadores. O “FANTASMA” do comunismo assusta os poderosos e unem, em uma “santa aliança”, todas as potências da época. È a velha “satanização” do adversário, que está “fora da ordem”, do “desobediente”. Mas o texto mostra o lado positivo disso: o reconhecimento da força do comunismo. Se assustar tanto, é porque tem alguma presença. Daí a necessidade de expor o modo comunista de ver o mundo e explicar suas finalidades, tão deturpadas por aqueles que o “demonizam”.
A parte I, denominada “BURGUESES E PROLETÀRIOS”, faz um resumo da história da humanidade até os dias de então, quando duas classes sociais antagônicas (as que titulam o capítulo) dominam o cenário.
A grande contribuição deste capítulo talvez seja a descrição das enormes transformações que a burguesia industrial provocava no mundo, representando “na história um papel essencialmente revolucionário”.
Com a argúcia de quem manejava com destreza instrumentos de análise socioeconômicas muito originais na época, Marx e Engels relatam (com sicera admiração!) o fenômeno da globalização que a burguesia implementava, mundializando o comércio, a navegação, os meios de comunicação etc..
O MANIFESTO fala de ontem, mas parece dizer de hoje. O desenvolvimento capitalista libera forças produtivas nunca vistas, “mais colossais e variadas que todas as gerações passadas em seu conjunto”. O poderio do capital que submete o trabalho é anunciado e nos faz pensar no agora do revigoramento neoliberal: nos últimos 40 anos do século XX e, no início do XXI, foram produzidos mais objetos do que em toda a produção econômica anterior, desde os primórdios da humanidade.
A revolução tecnológica e científica a que assistimos cujos ícones são os computadores e satélites e cujo poder hegemônico é a burguesia, não passa de continuação daquela descrita no MANIFESTO, que “criou maravilhas maiores que as pirâmides do Egito, que os aquedutos romanos e as catedrais góticas; conduziram expedições maiores que as antigas migrações de povos e ceuzadas”. Um elogio ao dinamismo da burguesia?
Impiedoso com os setores médios da sociedade – já minoritários nas formações sociais mais conhecidas da Europa -, o MANIFESTO chega a ser cruel com os desempregados, os mendigos, os marginalizados, “essa escória das camadas mais baixas da sociedade”, que pode ser arrastada por uma revolução proletária, mas, por suas condições de vida, está predisposta a “vender-se à reação”. Dá a entender que só os operários fabris serão capazes de fazer a revolução.
A relativação do papel dos comunistas junto ao proletariado é o aspecto mais interessante da parte II, intitulada “PROLETÁRIOS E COMUNISTAS”.
Depois de quase um século de dogmatismos, partidos únicos e “de vanguarda” portadores de verdades inteiras, é saudável ler que “os comunistas não formam um partido à parte, oposto a outros partidos operários, e não têm interesses que os separem do proletariado em geral”.
Embora, sem qualquer humildade, o MANIFESTO atribua aos comunistas mais decisões, avanço, lucidez e liderança do que às outras frações que buscam representar o proletariado, seus objetivos são tidos como comuns: a organização dos proletários para a conquista do poder político e a destruição de supremacia burguesa.
O “fantasma” do comunismo assombrava a Europa e o livro procura contestar, nessa parte, todos os estigmas que as classes poderosas e influentes jogavam sobre ele. Vejamos alguns desses estigmas, bastante atuais, e a resposta do MANIFESTO:
Os comunistas querem acabar com toda a propriedade, inclusive a pessoal!
Você já deve ter ouvido isso... Em 1989, no Brasil, quando LULA quase chegou lá, seus adversários espalharam o boato de que as famílias de classe média teriam que dividir suas casas com os sem-teto... A bobagem é velha, de mais de 150 anos. Marx e Engels responderam que queriam abolir a propriedade burguesa, capitalista. Para os socialistas, a apropriação pessoal dos frutos do trabalho e aqueles bens indispensáveis à vida humana eram intocáveis. Ao que se sabem roupas, calçados, moradia não são geradores de lucros para quem os possui... O MANIFESTO a esse respeito foi definitivo, apesar de a propaganda anticomunista e burra não ter lhe dado ouvidos: “O comunismo não retira a ninguém o poder de apropriar-se de sua parte dos produtos sociais, tira apenas o poder de escravizar o trabalho de outrem por meio dessa apropriação”.
Os comunistas querem acabar com a fampilia e com a educação!
Sempre há alguém pronto para falar do comunista “comedor de criancinha”. Ao auvir isso, não deixe de indagar se uma família pode viver com o salário mpinimo, o pai e mãe desempregados e uma moradia sem forneciemnto de água e sem luz. E se uma criança pode ser educada para a vida numa escola pública abandonada pelo governo, que finge que paga aos professores e funcionários. Na sociedade capitalista a educação é ela própria, um comércio, uma atividade lucrativa...
Os comunistas querem socializar as mulheres!
Essa fazia parte do catecismo de “satanização” das idéias socialistas. “Para o burguês, sua mulher nada mais é que um instrumento de produção. Ouvindo dizer que os instrumentos de produção serão postos em comum, ele conclui naturalmente que haverá comunidade de mulheres. O burguês não desconfia que se trata precisamente de dar à mulher outro papel que o de simples instrumento de produção”. È bom lembrar que alguns socialistas, até hoje, não conseguiram aceitar essa nova compreensão da mulher. O machismo nega o marxismo...
A parte III, denominada “LITERATURA SOCIALISTA E COMUNISTA” faz fortes críticas às diferentes correntes socialistas da época.
O MANIFESTO corta com a afiada faca da ironia três tipos de socialismo da época: o “socialismo reacionário” (subdividido em socialismo feudal, socialismo pequeno-burguês e socialismo alemão, o “socialismo conservador e burguês” e o “socialismo e comunismo crítico-utópico”).
Nesse capítulo a obra mostra seu caráter temporal, quase local. Revela sua profunda imersão na efervescência das idéias e combates daquela época, quando a aristocracia, para salvar os dedos já sem seus ricos anéis, condena a burguesia e, numa súbita generosidade, tece loas a um vago socialismo.
A conclusão, “POSIÇÂO DOS COMUNISTAS DIANTE DOS DIFERENTES PARTIDOS DE OPOSIÇÂO” é um relato das táticas adotadas naquele momento pelos comunistas, na França, na Suiça, na Polônia e na Alemanha. Estados Unidos e Rússia, que viviam momentos de alta tensão social e política, não são mencionados, como reconheceu Engels em maio de 1890, ao destacar com sinceridade “o quanto era estreito o terreno de ação do movimento proletário no momento da primeira publicação do MANIFESTO em fevereiro de 1848”.
O MANIFESTO COMUNISTA como não poderia deixar de ser, termina triunfalista e animando. Não quer espiritualizar e sim emocionar para a luta. Curiosamente, retoma a idéia do “fantasma”, ao desejar que “as classes dominantes tremam diante da idéia de uma revolução comunista”. Os peoletários, que têm um mundo a ganhar com a revolução, também são, afinal, conclamados, na célebre frase, que tantos sonhos, projetos de vida e revoluções sociais já inspirou:
“PROLETÁRIOS DE TODOS OS PAÍSES, UNI-VOS!”
O atual momento de crise que atravessa o capitalismo, com suas nuances de capital volátil, é um exemplo claro daquilo que Marx e Engels preconizava no manifesto a mais de 150 anos atrás. Portanto, dizer que as idéias e atitudes descritas pelos dois gênios dos ideáis socialistas estão utrapassados é no mínimo ingenuidade para não dizer ignorância.
*Jeorge Luiz Cardozo – Professor da Faculdade Dom Luiz, Graduado em Filosofia (UCSAL/2000), Especialista em Educação (UNEB/2003) e Assessor Técnico da Secretaria Municipal de Educação de Salvador.
sexta-feira, 26 de março de 2010
PRONUCIAMENTO DO DEPUTADO FEDERAL IVAN VALENTE PSOL/SP A CERCA DO PNDH-3 IMPORTANTE.
Em defesa da integralidade do PNDH-3
Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados,
Na manhã desta quinta-feira, diversas organizações de defesa dos direitos humanos estão reunidas aqui em Brasília, numa agenda que inclui encontros com a Comissão de Direitos Humanos e Minorias desta Casa e com a Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, para debater as alterações que o governo anunciou que fará na terceira edição do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3). Trata-se de uma iniciativa para organizar uma resistência aos verdadeiros ataques que o Programa vem sofrendo e, infelizmente, ao recuo que vem sendo manifestado pelo governo Lula neste sentido.
No mês passado, estive aqui nesta Tribuna justamente para defender o PNDH-3 do bombardeamento público que vinha sofrendo, dos setores conservadores e reacionários deste país e também dos grandes meios de comunicação. Naquela ocasião, foram muitos os que vieram a público apoiar a integralidade do Programa e manifestar solidariedade ao Ministro Paulo Vannuchi.
Recentemente, no entanto, como resultado das pressões de setores ligados à alta hierarquia da estrutura de poder vigente – ruralistas, latifundiários, donos da mídia, militares e o episcopado católico –, o governo não resistiu e decidiu alterar pontos estratégicos no PNDH-3. O primeiro, alterado já no momento da publicação do decreto, foi o que acabou ampliando a atuação da Comissão da Verdade para analisar também o que os militares consideram como atos criminosos daqueles que resistiram à ditadura.
Agora, será a hora de retirar a diretriz de apoio ao Projeto de Lei que descriminaliza o aborto, atendendo aos pedidos da igreja em detrimento da luta histórica das feministas. Pelo mesmo lobby católico, será retirada a proibição de símbolos religiosos, tais como crucifixos nas paredes de prédios públicos, ignorando o princípio constitucional da laicidade do Estado.
Do pacote de exigências dos ruralistas – que neste caso contaram com o suporte do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – cairá a necessidade de realização de audiência prévia com os envolvidos em conflitos agrários antes de decisões judiciais de reintegração de posse.
Tal aliança escusa entre os setores acima mencionados, que a todo tempo vocalizam o PNDH-3 como um documento autoritário e ameaçador às liberdades individuais, numa clara manipulação da opinião pública, também coloca sob risco a fiscalização das violações de direitos humanos praticadas pelos concessionários de rádio e TV; a proposta de taxação de grandes fortunas; de união homoafetiva e adoção de crianças por famílias homoparentais; e a própria apuração dos crimes cometidos pela Ditadura Militar, negados pelos militares no governo.
Na última semana, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e a Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomércio) anunciaram que também vão lançar um manifesto contra o PNDH-3. Já as entidades de imprensa – ANJ (Associação Nacional dos Jornais), Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV) e Aner (Associação Nacional dos Editores de Revistas) – discutiram a possibilidade de ingressar no Supremo Tribunal Federal (STF) com cada uma das diretrizes do programa.
Foram orientadas, nada mais nada menos, do que pelo jurista Ives Gandra Martins, que tem sido o responsável por propagar a leitura mais enviesada do PNDH que circula na opinião pública. De Ives Gandra, o presidente da Aner, Roberto Muylaert reproduziu a idéia de que o Programa Nacional de Direitos Humanos deveria ser queimado.
Neste sentido, Senhor Presidente, e sabendo que a grita conservadora está alcançando seus objetivos, é preciso dar um basta à artilharia, ou então organizar o contra-ataque. Se vão dilacerar o PNDH por pressão, corremos o risco de, muito em breve, nada ficar no Programa.
Por isso, os movimentos e organizações de defesa dos direitos humanos vieram nesta quinta a Brasília e se pronunciaram, nos últimos dias, no sentido de explicar que as modificações anunciadas para o texto não foram resultado de qualquer negociação com os movimentos sociais brasileiros, como sugeriu o ministro Vannuchi numa entrevista recente à Agência Brasil. Pelo contrário, essas propostas de alteração foram recusadas formalmente por diversas entidades da sociedade civil.
Paulo Vannuchi declarou que, para tratar da alteração do programa, reuniu-se com os ministro da Saúde, José Gomes Temporão e do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel; com o ouvidor agrário nacional, Gercino José da silva Filho, com a secretária especial de Políticas para as Mulheres, Nilcéia Freire; com a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e com 11 organizações do movimento feminista.
Ora, Senhoras e Senhores deputados, como bem lembrou o manifesto distribuído pela Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais, o PNDH-3 não é um documento construído exclusivamente pela SEDH. Quaisquer alterações em seu texto deveriam ser discutidas coletivamente com o conjunto dos movimentos de direitos humanos e também com os setores do governo que participaram da construção e redação do Programa, sob pena de tais modificações serem ilegítimas e antidemocráticas.
Onde estavam tais segmentos quando o Programa foi discutido em dezenas de conferências públicas? Qual o valor que realmente queremos dar aos instrumentos de democracia participativa que vem sendo consolidados no Brasil? Que sinalização de garantia e proteção aos direitos humanos estamos dando a posições retrógadas de nossa sociedade ao recuar de tal forma com medo da opinião pública e do poder desses segmentos?
Como está, o PNDH-3 representa um avanço significativo para a efetivação dos direitos humanos como uma política de Estado no Brasil e para o respeito e cumprimento de tantos acordos, tratados e convenções internacionais ratificadas pelo nosso país e que hoje fazem parte de nosso ordenamento jurídico.
Jogar fora esta história ou parte significativa dela, como nos faz crer a intenção do governo federal, representará um retrocesso para a democracia brasileira e também para o sistema de construção participativa das políticas públicas. Será jogar fora a memória daqueles e daquelas que morreram lutando em defesa dos direitos humanos no Brasil. E, por fim, será um recado para as futuras gerações de que ainda estamos longe de fazer ouvir as vozes excluídas deste país.
Muito obrigado.
Ivan Valente
Deputado Federal PSOL-SP
Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados,
Na manhã desta quinta-feira, diversas organizações de defesa dos direitos humanos estão reunidas aqui em Brasília, numa agenda que inclui encontros com a Comissão de Direitos Humanos e Minorias desta Casa e com a Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, para debater as alterações que o governo anunciou que fará na terceira edição do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3). Trata-se de uma iniciativa para organizar uma resistência aos verdadeiros ataques que o Programa vem sofrendo e, infelizmente, ao recuo que vem sendo manifestado pelo governo Lula neste sentido.
No mês passado, estive aqui nesta Tribuna justamente para defender o PNDH-3 do bombardeamento público que vinha sofrendo, dos setores conservadores e reacionários deste país e também dos grandes meios de comunicação. Naquela ocasião, foram muitos os que vieram a público apoiar a integralidade do Programa e manifestar solidariedade ao Ministro Paulo Vannuchi.
Recentemente, no entanto, como resultado das pressões de setores ligados à alta hierarquia da estrutura de poder vigente – ruralistas, latifundiários, donos da mídia, militares e o episcopado católico –, o governo não resistiu e decidiu alterar pontos estratégicos no PNDH-3. O primeiro, alterado já no momento da publicação do decreto, foi o que acabou ampliando a atuação da Comissão da Verdade para analisar também o que os militares consideram como atos criminosos daqueles que resistiram à ditadura.
Agora, será a hora de retirar a diretriz de apoio ao Projeto de Lei que descriminaliza o aborto, atendendo aos pedidos da igreja em detrimento da luta histórica das feministas. Pelo mesmo lobby católico, será retirada a proibição de símbolos religiosos, tais como crucifixos nas paredes de prédios públicos, ignorando o princípio constitucional da laicidade do Estado.
Do pacote de exigências dos ruralistas – que neste caso contaram com o suporte do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – cairá a necessidade de realização de audiência prévia com os envolvidos em conflitos agrários antes de decisões judiciais de reintegração de posse.
Tal aliança escusa entre os setores acima mencionados, que a todo tempo vocalizam o PNDH-3 como um documento autoritário e ameaçador às liberdades individuais, numa clara manipulação da opinião pública, também coloca sob risco a fiscalização das violações de direitos humanos praticadas pelos concessionários de rádio e TV; a proposta de taxação de grandes fortunas; de união homoafetiva e adoção de crianças por famílias homoparentais; e a própria apuração dos crimes cometidos pela Ditadura Militar, negados pelos militares no governo.
Na última semana, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e a Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomércio) anunciaram que também vão lançar um manifesto contra o PNDH-3. Já as entidades de imprensa – ANJ (Associação Nacional dos Jornais), Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV) e Aner (Associação Nacional dos Editores de Revistas) – discutiram a possibilidade de ingressar no Supremo Tribunal Federal (STF) com cada uma das diretrizes do programa.
Foram orientadas, nada mais nada menos, do que pelo jurista Ives Gandra Martins, que tem sido o responsável por propagar a leitura mais enviesada do PNDH que circula na opinião pública. De Ives Gandra, o presidente da Aner, Roberto Muylaert reproduziu a idéia de que o Programa Nacional de Direitos Humanos deveria ser queimado.
Neste sentido, Senhor Presidente, e sabendo que a grita conservadora está alcançando seus objetivos, é preciso dar um basta à artilharia, ou então organizar o contra-ataque. Se vão dilacerar o PNDH por pressão, corremos o risco de, muito em breve, nada ficar no Programa.
Por isso, os movimentos e organizações de defesa dos direitos humanos vieram nesta quinta a Brasília e se pronunciaram, nos últimos dias, no sentido de explicar que as modificações anunciadas para o texto não foram resultado de qualquer negociação com os movimentos sociais brasileiros, como sugeriu o ministro Vannuchi numa entrevista recente à Agência Brasil. Pelo contrário, essas propostas de alteração foram recusadas formalmente por diversas entidades da sociedade civil.
Paulo Vannuchi declarou que, para tratar da alteração do programa, reuniu-se com os ministro da Saúde, José Gomes Temporão e do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel; com o ouvidor agrário nacional, Gercino José da silva Filho, com a secretária especial de Políticas para as Mulheres, Nilcéia Freire; com a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e com 11 organizações do movimento feminista.
Ora, Senhoras e Senhores deputados, como bem lembrou o manifesto distribuído pela Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais, o PNDH-3 não é um documento construído exclusivamente pela SEDH. Quaisquer alterações em seu texto deveriam ser discutidas coletivamente com o conjunto dos movimentos de direitos humanos e também com os setores do governo que participaram da construção e redação do Programa, sob pena de tais modificações serem ilegítimas e antidemocráticas.
Onde estavam tais segmentos quando o Programa foi discutido em dezenas de conferências públicas? Qual o valor que realmente queremos dar aos instrumentos de democracia participativa que vem sendo consolidados no Brasil? Que sinalização de garantia e proteção aos direitos humanos estamos dando a posições retrógadas de nossa sociedade ao recuar de tal forma com medo da opinião pública e do poder desses segmentos?
Como está, o PNDH-3 representa um avanço significativo para a efetivação dos direitos humanos como uma política de Estado no Brasil e para o respeito e cumprimento de tantos acordos, tratados e convenções internacionais ratificadas pelo nosso país e que hoje fazem parte de nosso ordenamento jurídico.
Jogar fora esta história ou parte significativa dela, como nos faz crer a intenção do governo federal, representará um retrocesso para a democracia brasileira e também para o sistema de construção participativa das políticas públicas. Será jogar fora a memória daqueles e daquelas que morreram lutando em defesa dos direitos humanos no Brasil. E, por fim, será um recado para as futuras gerações de que ainda estamos longe de fazer ouvir as vozes excluídas deste país.
Muito obrigado.
Ivan Valente
Deputado Federal PSOL-SP
quarta-feira, 24 de março de 2010
Defender o projeto PSOL é ampliar nossa inserção junto aos trabalhadores
19 de março de 2010
Por Luciana Araujo*
A 3ª Conferência Eleitoral de nosso jovem partido assume uma dimensão fundamental na atual quadra da luta de classes em nosso país. Após acompanhar seis dos oito debates realizados entre os três pré-candidatos à Presidência da República pelo PSOL, considero importante sistematizar, de forma respeitosa, as divergências políticas que se colocam entre as pré-candidaturas de Plínio Arruda Sampaio e Martiniano Cavalcante. Evidencia-se a necessidade de uma discussão de fundo em nossa 3ª Conferência: o programa apresentado pelo companheiro Martiniano levará o PSOL a aparecer no debate eleitoral com um perfil de centro esquerda conservador, que põe o risco em risco o projeto do PSOL como partido de vocação anticapitalista, alternativa de esquerda socialista.
O tema da dívida: eliminar a tirania financeira sobre os destinos do país
A questão da dívida pública é central para o debate e o programa do PSOL no dia-a-dia das lutas e nas eleições. Uma importante marca política de nosso partido no último período foi a luta pela instalação da CPI da Dívida Pública no Congresso Nacional – capitaneada pelo deputado federal Ivan Valente (PSOL/SP).
Ao longo de todo o ano de 2009, resgatamos uma intervenção unitária com os companheiros da Campanha pela Auditoria Cidadã da Dívida, que têm colaborado diretamente com o PSOL na CPI na denúncia do que significa o grilhão da dívida em nosso país para a classe trabalhadora.
Martiniano reivindica que, na campanha eleitoral, o PSOL se ampare na correta reivindicação da auditoria, proposta pelo movimento da Auditoria Cidadã. No entanto, contrapõe a auditoria à defesa da suspensão do pagamento dos juros, que seria vista como a defesa do “calote”.
A posição de suspensão do pagamento dos juros e serviços da dívida acumulou, na última década, o respaldo dos dois plebiscitos populares promovidos por toda a esquerda combativa, os movimentos sociais e os setores progressistas da igreja católica. O movimento da Auditoria Cidadã nasceu a partir do Plebiscito da Dívida, realizado em 2000 com a participação de mais de 6 milhões de brasileiros – dos quais 95% votaram pelo não pagamento da dívida externa e contra o comprometimento do orçamento em benefício dos especuladores. Em 2002, no Plebiscito sobre a ALCA, no qual votaram 10 milhões de pessoas, novamente o comprometimento do orçamento com a dívida pública foi repudiado.
É essa força popular que o PSOL deve resgatar na campanha eleitoral para explicar à população o quão legítima é a defesa da “eliminação da tirania financeira, da especulação e do fardo das dívidas”, como afirmávamos no Manifesto da Frente de Esquerda de 2006 – documento de lançamento da candidatura da companheira Heloísa Helena elaborado pelo PSOL em conjunto com o PCB e o PSTU.
Não podemos ficar acuados diante capital financeiro, que sempre tentará deslegitimar a proposta socialista, mesmo após os governos do mundo inteiro terem liberado mais 3 trilhões de dólares para salvar o capital da bancarrota na crise aberta em 2008. Temos que “devolver a bola” e dialogar com a população sobre o que significaria esses 3 trilhões de dólares na recuperação da capacidade de intervenção e regulação estatal, na expansão dos serviços públicos, na redistribuição e garantia de renda, geração de empregos, reforma agrária e urbana, enfim, para avançar na “superação da miséria em que está mergulhada a maioria da população brasileira e atender as reivindicações histórias dos trabalhadores e do povo” – como postulava o Manifesto da Frente de Esquerda de 2006.
Aliás, o programa fundacional do PSOL já apontava a necessidade de “anular o pagamento da dívida com os bancos”, como resultante da auditoria proposta por nosso partido sobre a dívida interna.
A polêmica sobre a estatização
Em seu manifesto e em todos os debates, Martiniano reafirmou que não concorda que o programa eleitoral do PSOL defenda a estatização de setores econômicos, sejam da indústria ou dos serviços como educação e saúde.
No debate de Brasília, Martiniano chegou a afirmar que a defesa da estatização geral da saúde significaria, na cabeça do povo brasileiro, serviços de péssima qualidade para todos. Isso seria verdade se o PSOL não atrelasse a defesa da saúde e educação públicas ao rompimento com a lógica atual da amarra da dívida pública, à suspensão do pagamento dos juros para garantir o financiamento das áreas sociais. O governo Lula em seis anos, até o final de 2008, pagou R$ 960 bilhões de juros e amortização da dívida, como tem sempre repetido o companheiro Babá em todos os debates. Com esse dinheiro seria possível investir na expansão da saúde pública e gratuita com a qualidade de centros de excelência como o HC/SP, o Sarah Kubitscheck/DF – numa lógica pública e sem participação do capital privado das fundações. Além de garantir recursos para a reforma agrária e urbana, infra-estrutura e outras demandas sociais .
E o que deveremos fazer com a Vale do Rio Doce, a Petrobrás, o sistema elétrico? Manter privatizados? Vamos ou não defender o que prevê o programa do PSOL e o Manifesto da Frente de Esquerda de 2006, que prevêm como necessidade imediata o controle estatal do câmbio e a estatização do sistema financeiro? Vamos ocultar do debate eleitoral o que está no programa do PSOL? Vamos deixar nas mãos de Obama, Merkel, Lula e outros a disseminação no imaginário popular de que “estatização” por eles promovida é salvação do capital?
Devemos ou não afirmar que só com a estatização, de fato, de setores essenciais da economia (como o sistema financeiro, a educação e a saúde) os direitos dos trabalhadores serão preservados? Em nossa opinião, sim.
As bases políticas apresentadas no Manifesto da Frente de Esquerda de 2006 propunha “a revogação imediata das privatizações das empresas estatais, a começar pela da Vale do Rio Doce, anulação das privatizações parciais da Petrobrás e dos leilões das reservas de petróleo”, entre outros pontos. O Manifesto da Frente de Esquerda defendia ainda que “áreas estratégicas devem estar sob controle do povo brasileiro como no petróleo, telecomunicações, energia, siderurgia”, para conter a dinâmica dos grupos estrangeiros que se utilizam das mesmas para remeter grandes lucros para suas matrizes. Essa é a política que a pré-candidatura de Plínio Arruda Sampaio defende, em defesa do projeto do nosso partido.
A tarefa central no Brasil é a convocação de uma constituinte?
O companheiro Martiniano vem afirmando avaliar que a correlação de forças é “amplamente favorável ao capital” e “amplamente desfavorável às ideias socialistas”. Na opinião de Cavalcante, o governo Lula estava mais fraco, em 2006, quando Heloísa Helena disputou a Presidência da República, que hoje. No entanto, apesar de fazer esta análise da realidade – legítima, concordemos ou não –, o companheiro propõe que o ponto hierarquizador do programa eleitoral do PSOL seja a convocação de uma constituinte “para redimensionar o poder” no Estado brasileiro.
A análise da realidade e a proposta apresentada como eixo da campanha são, no mínimo, contraditórias. Se mesmo na constituinte de 1988, resultado do ascenso que pôs fim à ditadura militar no país, as reivindicações mais avançadas dos movimentos sociais e dos trabalhadores foram excluídas do texto, o que dizer do resultado de uma possível constituinte em uma conjuntura tão defensiva. Questionado sobre essa contradição em pelo menos três debates, Martiniano não explicou como poderíamos “dialogar com o povo” nessa questão.
Obviamente, temos que defender medidas democratizantes do sistema político brasileiro: como a realização dos plebiscitos sobre todos os grandes temas nacionais, o financiamento público exclusivo de campanha, revogabilidade dos mandatos, combate radical à corrupção denunciando sua relação direta com o regime político e o sistema capitalista, fim do foro privilegiado, fim dos sigilos bancário e fiscal de ocupantes de cargos públicos, etc. Mas essas medidas não têm que estar atreladas a uma reforma constitucional a ser promovida pelo Congresso de Sarney, Collor, Renan, ACM Neto, João Paulo Cunha e companhia – cujo resultado é já uma derrota anunciada.
Abolir a moderna escravatura pelo combate à superexploração do trabalho e não por políticas compensatórias
Outro tema apontado por Martiniano como central do programa eleitoral que defende para o PSOL na disputa eleitoral de 2010 é a “abolição da moderna escravatura, com metas e prazos concretos para a saúde e educação públicas, inclusive para eliminação do analfabetismo, dos déficits de habitação, saneamento e transporte público”. Outra proposta programática de Martiniano na área social é que “dialoguemos” com as política compensatórias instituídas pelo governo Lula e que entorpecem as massas empobrecidas de nosso país, garantindo a alta popularidade do lulismo.
Primeiramente, não são os prazos que diferenciarão nosso programa de todos os demais apresentados na eleição – aliás é prática corrente em todos os governos burgueses o estabelecimento de metas “de governo”, “da década”, “do milênio”, que depois são abandonadas. Lula mesmo se elegeu prometendo criar 10 milhões de empregos em quatro anos e o PSDB é o partido do “gerente” Serra.
Mas, para além disso, o fundamental é que o conteúdo da proposta é uma ruptura com a plataforma apresentada no Manifesto da Frente de Esquerda em 2006, que era enfático e claro ao estabelecer uma política de superação do assistencialismo, defendendo “uma política radical de enfrentamento à superexploração do trabalho no Brasil; um plano de obras públicas para absorver o desemprego, ao lado da redução da jornada de trabalho sem redução salarial; dobrar o salário mínimo de imediato; realizar uma reforma agrária ampla e controlada pelos trabalhadores do campo; a revogação das reformas neoliberais, a começar pela reforma da previdência; creches e pré-escolas para crianças de 0 a 6 anos.
Como afirmava o Manifesto da Frente, “a dignidade do trabalhador começa por seu direito ao trabalho e a um salário digno”. Essa é a política que propõe a pré-candidatura de Plínio. É essa a política que o PSOL deve seguir reafirmando.
O problema ambiental
Martiniano nos debates reconheceu a importância da questão ambiental e chegou a propor uma estatal ambiental. Mas a questão é que não há coerência entre dar à questão ambiental o devido peso e ter defendido com unhas e dentes que o PSOL se coligasse com Marina Silva e o PV.
Para além da questão de que não teria cabimento a aliança com o partido de Zequinha Sarney, o fato é que não são compatíveis um projeto ecossocialista, vocação do PSOl, com a defesa de Marina Silva. Os “verdes” do PV são parte da ordem que destrói os recursos naturais em um patamar nunca visto. E Marina defende os transgênicos, a transposição do rio São Francisco, a Lei das Florestas e a MP da grilagem na Amazônia, tudo para assegurar os lucros de uma meia dúzia de empresas transnacionais. Foi também sob a gestão de Marina Silva à frente do Ministério do Meio Ambiente que o IBAMA foi desmontado para favorecer os interesses do agronegócio. O que isto tem a ver com um projeto ecossocialista na questão ambiental?
Martiniano criticou por diversas vezes o fato de Plínio ter feito críticas duras a Marina. Plínio escreveu em editorial do “Correio da Cidadania”, em 20 de agosto de 2009, que a candidatura de Marina poderia até ser uma nesga de céu azul em dia chuvoso, mas isso dependeria dela se aliar ou não aos “verdes”, o que se concretizou da forma mais conservadora possível. E como trataremos as propostas da candidata do PV nos debates eleitorais? O que diremos sobre Belo Monte, Jirau, os transgênicos, a transposição – que Marina está correta ou que essas propostas só beneficiam o capital? É tarefa do candidato do PSOL defender as posições programáticas do partido e explicar à população que essas são propostas ecocapitalistas, do “ambientalismo” comprometido com os lucros do capital.
A polêmica com a defesa do Socialismo
Outra polêmica surgida nos debates é a defesa do socialismo. Na opinião do companheiro Martiniano, devido à “correlação de forças amplamente desfavorável”, uma campanha com este caráter nos levaria ao gueto. É verdade que a correlação de forças é muito difícil, que o desastre do Leste Europeu gestou uma brutal confusão na cabeça da classe trabalhadora em todo o mundo sobre o que é o socialismo. No entanto, não é à toa que, aqui mesmo em nosso continente, seja tão forte – especialmente na juventude – o slogan do “socialismo do século XXI” alardeado pelo governo Chávez. Polêmicas com o chavismo e divergências sobre o que é o “socialismo do século XXI” defendido na Venezuela à parte, é um fato que – apesar de minoritária na sociedade – a ideia do socialismo tem hoje muito mais aceitação do que teve em toda a década de 1990: o que não nos impediu de continuar nos reivindicando socialistas e de fundar, em meio à vaga da eleição de Lula, o Partido Socialismo e Liberdade.
Dialogar com a população que a única saída efetiva para as mazelas de suas vidas é o socialismo, a superação e ruptura com o sistema capitalista, é essencial para a acumulação de forças, para a disputa de corações e mentes para a luta anticapitalista com alternativa. E organizar a parcela dos socialistas hoje dispersos pela falência das experiências do século XX, especialmente a do PT no Brasil, é nossa obrigação. E não autoproclamação. Só assim o PSOL poderá se colocar como alternativa de esquerda nas eleições e para além delas. Foi assim que, na disputa ao Governo do Estado de São Paulo em 2006, conquistamos para o PSOL a segunda maior votação do país, a eleição de dois deputados estaduais e a reeleição de Ivan Valente à Câmara dos Deputados.
Não podemos entrar na campanha eleitoral com um programa de centro-esquerda conservador. O diferencial do PSOL é exatamente ser “um novo partido contra a velha política”, contra as amarras da lógica eleitoral da classe dominante.
O debate sobre o balanço do PSOL
Por tudo já levantado acima, fica evidente que a candidatura de Plínio Arruda Sampaio é a representação da defesa do acúmulo que construímos até aqui. Não um acúmulo acrítico, que não se debruce sobre os erros que cometemos para ajustar nosso caminho e solidificar nossa trajetória. E é nesse sentido que a pré-candidatura de Plínio aponta a necessidade de refletirmos sobre nossa prática, como marxistas que somos.
Mais que isso, Plínio se propõe a ser uma candidatura que defenda as resoluções e o programa do partido, ainda que o candidato tenha restrições de ordem pessoal a algumas questões: porque a candidatura do partido deve ser a expressão do coletivo e não de opiniões individuais.
Porque se é algo que devemos ter nesta campanha eleitoral é uma candidatura que fale o programa do partido, o que é construído de forma coletiva, e não a expressão de posições individuais, que ignoram as decisões e acordos construídos no partido.
As tarefas da candidatura do PSOL
Em muitos momentos, Martiniano acusou Plínio de ser indulgente com o PT. Para resguardar a verdade histórica e estabelecer um patamar de polêmicas fraternas entre nós, é importante registrar que Plínio propõe três tarefas centrais ao PSOL na campanha eleitoral. E a primeira delas é ser o contraponto ao PT e ao PSDB.
Se há uma figura em nosso partido que foi procurada pela mídia para fazer o balanço dos 30 anos do PT, pelo significado e o peso de sua ruptura com aquela sigla, foi Plínio Arruda Sampaio.
A utilização de frases soltas publicadas em veículos dessa mesma grande mídia para polemizar com Plínio sobre sua capacidade de polarizar com o PT é, no mínimo, desleal, para falarmos francamente entre companheiros.
Pior ainda é citar em debates frases ditas por Plínio quando estava no PT, disputando o PED (o que aglutinou a segunda leva de rupturas com aquele partido que vieram a se somar ao PSOL), como foi feito no debate do Rio de Janeiro, uma descontextualização grosseira.
A segunda tarefa central proposta por Plínio é a luta pela ampliação de nossa inserção social e pela manutenção e crescimento das nossas bancadas parlamentares. Onde está o propagandismo, sectarismo ou autoproclamação dessa proposta? Queremos ou não lutar duramente para manter os valorosos mandatos parlamentares conquistados por nosso jovem PSOL? O candidato à Presidência da República pelo PSOL deve ou não organizar sua agenda a partir desta perspectiva, assegurando para além das eleições visibilidade ao partido na luta contra os governos e o capital? Essa é a proposta concreta de Plínio Arruda Sampaio: organizar sua agenda de atividades da campanha presidencial colada às agendas, em primeiro lugar, dos atuais deputados federais e estaduais do partido para impulsionar a reeleição dos mesmos, mas também junto às demais candidaturas do PSOL para buscar ampliar a possibilidade de atuarmos nos legislativos estaduais e no Congresso Nacional em defesa dos direitos da classe trabalhadora, em oposição ao PT, ao PSDB e aos partidos que sustentam esses dois blocos de poder (incluído aí o PV da senadora Marina Silva).
A terceira tarefa proposta por Plínio é a busca pela retomada da Frente de Esquerda com o PCB e o PSTU. Obviamente essa tarefa está hoje mais difícil porque o PSOL adiou por oito meses (desde agosto do ano passado, quando realizamos nosso 2º Congresso) nossa definição de política eleitoral. Temos que compreender que a unidade se constrói também no respeito aos demais setores da esquerda, que viram de fora, assistindo pela mídia aos debates internos do PSOL, a possibilidade concreta de entrarmos nessa eleição vinculados ao PV de Zequinha Sarney, que sustenta e compõe governos em quase todos os estados da federação.
No entanto, se há alguma chance de rearticularmos a Frente de Esquerda, devemos lutar para concretiza-la. Para evitar a fragmentação dos socialistas nas eleições, para favorecer a aglutinação dos movimentos sociais combativos, para fortalecer a voz da esquerda na disputa contra a falsa polarização PT-PSDB.
Plínio Arruda Sampaio: coerência para transformar o Brasil
Vamos às ruas, construir uma campanha com capacidade convocatória sem perder a dimensão de classe, para organizar aqueles que o Estado brasileiro desorganiza. Uma campanha socialista, sem amarras com o capital, sem dinheiro de bancos, empreiteiras, multinacionais ou empresas com passivos ambientais e trabalhistas, como prevê o estatuto de nosso partido. Uma campanha anticapitalista de caráter claramente socialista.
E temos em nosso partido um nome com história, expressão na vida política brasileira, estatura para reconstruir a Frente de Esquerda, conquistar o apoio de amplos setores do MST (o maior movimento social da América Latina), atrair os setores progressistas da igreja, dialogar didaticamente com a população e conquistar corações e mentes por sua coerência e pelo vigor de sua disposição de luta em defesa da classe no auge de seus 80 anos. Um nome que, como já demonstrado internamente em nosso partido, ao reunir o apoio de seis das nove teses apresentadas à 3ª Conferência Eleitoral do PSOL (além do apoio do deputado Chico Alencar, que assina outra das nove teses), pode construir, na diversidade que é a marca fundante do PSOL (o direito das tendências se expressarem publicamente), um projeto socialista para o Brasil. Esse nome é Plínio Arruda Sampaio.
Luciana Araujo integrou o diretório nacional fundacional do PSOL, integra a direção nacional do Coletivo Socialismo e Liberdade (CSOL) e escrve para o blog de professor Cardozo5013.
19 de março de 2010
Por Luciana Araujo*
A 3ª Conferência Eleitoral de nosso jovem partido assume uma dimensão fundamental na atual quadra da luta de classes em nosso país. Após acompanhar seis dos oito debates realizados entre os três pré-candidatos à Presidência da República pelo PSOL, considero importante sistematizar, de forma respeitosa, as divergências políticas que se colocam entre as pré-candidaturas de Plínio Arruda Sampaio e Martiniano Cavalcante. Evidencia-se a necessidade de uma discussão de fundo em nossa 3ª Conferência: o programa apresentado pelo companheiro Martiniano levará o PSOL a aparecer no debate eleitoral com um perfil de centro esquerda conservador, que põe o risco em risco o projeto do PSOL como partido de vocação anticapitalista, alternativa de esquerda socialista.
O tema da dívida: eliminar a tirania financeira sobre os destinos do país
A questão da dívida pública é central para o debate e o programa do PSOL no dia-a-dia das lutas e nas eleições. Uma importante marca política de nosso partido no último período foi a luta pela instalação da CPI da Dívida Pública no Congresso Nacional – capitaneada pelo deputado federal Ivan Valente (PSOL/SP).
Ao longo de todo o ano de 2009, resgatamos uma intervenção unitária com os companheiros da Campanha pela Auditoria Cidadã da Dívida, que têm colaborado diretamente com o PSOL na CPI na denúncia do que significa o grilhão da dívida em nosso país para a classe trabalhadora.
Martiniano reivindica que, na campanha eleitoral, o PSOL se ampare na correta reivindicação da auditoria, proposta pelo movimento da Auditoria Cidadã. No entanto, contrapõe a auditoria à defesa da suspensão do pagamento dos juros, que seria vista como a defesa do “calote”.
A posição de suspensão do pagamento dos juros e serviços da dívida acumulou, na última década, o respaldo dos dois plebiscitos populares promovidos por toda a esquerda combativa, os movimentos sociais e os setores progressistas da igreja católica. O movimento da Auditoria Cidadã nasceu a partir do Plebiscito da Dívida, realizado em 2000 com a participação de mais de 6 milhões de brasileiros – dos quais 95% votaram pelo não pagamento da dívida externa e contra o comprometimento do orçamento em benefício dos especuladores. Em 2002, no Plebiscito sobre a ALCA, no qual votaram 10 milhões de pessoas, novamente o comprometimento do orçamento com a dívida pública foi repudiado.
É essa força popular que o PSOL deve resgatar na campanha eleitoral para explicar à população o quão legítima é a defesa da “eliminação da tirania financeira, da especulação e do fardo das dívidas”, como afirmávamos no Manifesto da Frente de Esquerda de 2006 – documento de lançamento da candidatura da companheira Heloísa Helena elaborado pelo PSOL em conjunto com o PCB e o PSTU.
Não podemos ficar acuados diante capital financeiro, que sempre tentará deslegitimar a proposta socialista, mesmo após os governos do mundo inteiro terem liberado mais 3 trilhões de dólares para salvar o capital da bancarrota na crise aberta em 2008. Temos que “devolver a bola” e dialogar com a população sobre o que significaria esses 3 trilhões de dólares na recuperação da capacidade de intervenção e regulação estatal, na expansão dos serviços públicos, na redistribuição e garantia de renda, geração de empregos, reforma agrária e urbana, enfim, para avançar na “superação da miséria em que está mergulhada a maioria da população brasileira e atender as reivindicações histórias dos trabalhadores e do povo” – como postulava o Manifesto da Frente de Esquerda de 2006.
Aliás, o programa fundacional do PSOL já apontava a necessidade de “anular o pagamento da dívida com os bancos”, como resultante da auditoria proposta por nosso partido sobre a dívida interna.
A polêmica sobre a estatização
Em seu manifesto e em todos os debates, Martiniano reafirmou que não concorda que o programa eleitoral do PSOL defenda a estatização de setores econômicos, sejam da indústria ou dos serviços como educação e saúde.
No debate de Brasília, Martiniano chegou a afirmar que a defesa da estatização geral da saúde significaria, na cabeça do povo brasileiro, serviços de péssima qualidade para todos. Isso seria verdade se o PSOL não atrelasse a defesa da saúde e educação públicas ao rompimento com a lógica atual da amarra da dívida pública, à suspensão do pagamento dos juros para garantir o financiamento das áreas sociais. O governo Lula em seis anos, até o final de 2008, pagou R$ 960 bilhões de juros e amortização da dívida, como tem sempre repetido o companheiro Babá em todos os debates. Com esse dinheiro seria possível investir na expansão da saúde pública e gratuita com a qualidade de centros de excelência como o HC/SP, o Sarah Kubitscheck/DF – numa lógica pública e sem participação do capital privado das fundações. Além de garantir recursos para a reforma agrária e urbana, infra-estrutura e outras demandas sociais .
E o que deveremos fazer com a Vale do Rio Doce, a Petrobrás, o sistema elétrico? Manter privatizados? Vamos ou não defender o que prevê o programa do PSOL e o Manifesto da Frente de Esquerda de 2006, que prevêm como necessidade imediata o controle estatal do câmbio e a estatização do sistema financeiro? Vamos ocultar do debate eleitoral o que está no programa do PSOL? Vamos deixar nas mãos de Obama, Merkel, Lula e outros a disseminação no imaginário popular de que “estatização” por eles promovida é salvação do capital?
Devemos ou não afirmar que só com a estatização, de fato, de setores essenciais da economia (como o sistema financeiro, a educação e a saúde) os direitos dos trabalhadores serão preservados? Em nossa opinião, sim.
As bases políticas apresentadas no Manifesto da Frente de Esquerda de 2006 propunha “a revogação imediata das privatizações das empresas estatais, a começar pela da Vale do Rio Doce, anulação das privatizações parciais da Petrobrás e dos leilões das reservas de petróleo”, entre outros pontos. O Manifesto da Frente de Esquerda defendia ainda que “áreas estratégicas devem estar sob controle do povo brasileiro como no petróleo, telecomunicações, energia, siderurgia”, para conter a dinâmica dos grupos estrangeiros que se utilizam das mesmas para remeter grandes lucros para suas matrizes. Essa é a política que a pré-candidatura de Plínio Arruda Sampaio defende, em defesa do projeto do nosso partido.
A tarefa central no Brasil é a convocação de uma constituinte?
O companheiro Martiniano vem afirmando avaliar que a correlação de forças é “amplamente favorável ao capital” e “amplamente desfavorável às ideias socialistas”. Na opinião de Cavalcante, o governo Lula estava mais fraco, em 2006, quando Heloísa Helena disputou a Presidência da República, que hoje. No entanto, apesar de fazer esta análise da realidade – legítima, concordemos ou não –, o companheiro propõe que o ponto hierarquizador do programa eleitoral do PSOL seja a convocação de uma constituinte “para redimensionar o poder” no Estado brasileiro.
A análise da realidade e a proposta apresentada como eixo da campanha são, no mínimo, contraditórias. Se mesmo na constituinte de 1988, resultado do ascenso que pôs fim à ditadura militar no país, as reivindicações mais avançadas dos movimentos sociais e dos trabalhadores foram excluídas do texto, o que dizer do resultado de uma possível constituinte em uma conjuntura tão defensiva. Questionado sobre essa contradição em pelo menos três debates, Martiniano não explicou como poderíamos “dialogar com o povo” nessa questão.
Obviamente, temos que defender medidas democratizantes do sistema político brasileiro: como a realização dos plebiscitos sobre todos os grandes temas nacionais, o financiamento público exclusivo de campanha, revogabilidade dos mandatos, combate radical à corrupção denunciando sua relação direta com o regime político e o sistema capitalista, fim do foro privilegiado, fim dos sigilos bancário e fiscal de ocupantes de cargos públicos, etc. Mas essas medidas não têm que estar atreladas a uma reforma constitucional a ser promovida pelo Congresso de Sarney, Collor, Renan, ACM Neto, João Paulo Cunha e companhia – cujo resultado é já uma derrota anunciada.
Abolir a moderna escravatura pelo combate à superexploração do trabalho e não por políticas compensatórias
Outro tema apontado por Martiniano como central do programa eleitoral que defende para o PSOL na disputa eleitoral de 2010 é a “abolição da moderna escravatura, com metas e prazos concretos para a saúde e educação públicas, inclusive para eliminação do analfabetismo, dos déficits de habitação, saneamento e transporte público”. Outra proposta programática de Martiniano na área social é que “dialoguemos” com as política compensatórias instituídas pelo governo Lula e que entorpecem as massas empobrecidas de nosso país, garantindo a alta popularidade do lulismo.
Primeiramente, não são os prazos que diferenciarão nosso programa de todos os demais apresentados na eleição – aliás é prática corrente em todos os governos burgueses o estabelecimento de metas “de governo”, “da década”, “do milênio”, que depois são abandonadas. Lula mesmo se elegeu prometendo criar 10 milhões de empregos em quatro anos e o PSDB é o partido do “gerente” Serra.
Mas, para além disso, o fundamental é que o conteúdo da proposta é uma ruptura com a plataforma apresentada no Manifesto da Frente de Esquerda em 2006, que era enfático e claro ao estabelecer uma política de superação do assistencialismo, defendendo “uma política radical de enfrentamento à superexploração do trabalho no Brasil; um plano de obras públicas para absorver o desemprego, ao lado da redução da jornada de trabalho sem redução salarial; dobrar o salário mínimo de imediato; realizar uma reforma agrária ampla e controlada pelos trabalhadores do campo; a revogação das reformas neoliberais, a começar pela reforma da previdência; creches e pré-escolas para crianças de 0 a 6 anos.
Como afirmava o Manifesto da Frente, “a dignidade do trabalhador começa por seu direito ao trabalho e a um salário digno”. Essa é a política que propõe a pré-candidatura de Plínio. É essa a política que o PSOL deve seguir reafirmando.
O problema ambiental
Martiniano nos debates reconheceu a importância da questão ambiental e chegou a propor uma estatal ambiental. Mas a questão é que não há coerência entre dar à questão ambiental o devido peso e ter defendido com unhas e dentes que o PSOL se coligasse com Marina Silva e o PV.
Para além da questão de que não teria cabimento a aliança com o partido de Zequinha Sarney, o fato é que não são compatíveis um projeto ecossocialista, vocação do PSOl, com a defesa de Marina Silva. Os “verdes” do PV são parte da ordem que destrói os recursos naturais em um patamar nunca visto. E Marina defende os transgênicos, a transposição do rio São Francisco, a Lei das Florestas e a MP da grilagem na Amazônia, tudo para assegurar os lucros de uma meia dúzia de empresas transnacionais. Foi também sob a gestão de Marina Silva à frente do Ministério do Meio Ambiente que o IBAMA foi desmontado para favorecer os interesses do agronegócio. O que isto tem a ver com um projeto ecossocialista na questão ambiental?
Martiniano criticou por diversas vezes o fato de Plínio ter feito críticas duras a Marina. Plínio escreveu em editorial do “Correio da Cidadania”, em 20 de agosto de 2009, que a candidatura de Marina poderia até ser uma nesga de céu azul em dia chuvoso, mas isso dependeria dela se aliar ou não aos “verdes”, o que se concretizou da forma mais conservadora possível. E como trataremos as propostas da candidata do PV nos debates eleitorais? O que diremos sobre Belo Monte, Jirau, os transgênicos, a transposição – que Marina está correta ou que essas propostas só beneficiam o capital? É tarefa do candidato do PSOL defender as posições programáticas do partido e explicar à população que essas são propostas ecocapitalistas, do “ambientalismo” comprometido com os lucros do capital.
A polêmica com a defesa do Socialismo
Outra polêmica surgida nos debates é a defesa do socialismo. Na opinião do companheiro Martiniano, devido à “correlação de forças amplamente desfavorável”, uma campanha com este caráter nos levaria ao gueto. É verdade que a correlação de forças é muito difícil, que o desastre do Leste Europeu gestou uma brutal confusão na cabeça da classe trabalhadora em todo o mundo sobre o que é o socialismo. No entanto, não é à toa que, aqui mesmo em nosso continente, seja tão forte – especialmente na juventude – o slogan do “socialismo do século XXI” alardeado pelo governo Chávez. Polêmicas com o chavismo e divergências sobre o que é o “socialismo do século XXI” defendido na Venezuela à parte, é um fato que – apesar de minoritária na sociedade – a ideia do socialismo tem hoje muito mais aceitação do que teve em toda a década de 1990: o que não nos impediu de continuar nos reivindicando socialistas e de fundar, em meio à vaga da eleição de Lula, o Partido Socialismo e Liberdade.
Dialogar com a população que a única saída efetiva para as mazelas de suas vidas é o socialismo, a superação e ruptura com o sistema capitalista, é essencial para a acumulação de forças, para a disputa de corações e mentes para a luta anticapitalista com alternativa. E organizar a parcela dos socialistas hoje dispersos pela falência das experiências do século XX, especialmente a do PT no Brasil, é nossa obrigação. E não autoproclamação. Só assim o PSOL poderá se colocar como alternativa de esquerda nas eleições e para além delas. Foi assim que, na disputa ao Governo do Estado de São Paulo em 2006, conquistamos para o PSOL a segunda maior votação do país, a eleição de dois deputados estaduais e a reeleição de Ivan Valente à Câmara dos Deputados.
Não podemos entrar na campanha eleitoral com um programa de centro-esquerda conservador. O diferencial do PSOL é exatamente ser “um novo partido contra a velha política”, contra as amarras da lógica eleitoral da classe dominante.
O debate sobre o balanço do PSOL
Por tudo já levantado acima, fica evidente que a candidatura de Plínio Arruda Sampaio é a representação da defesa do acúmulo que construímos até aqui. Não um acúmulo acrítico, que não se debruce sobre os erros que cometemos para ajustar nosso caminho e solidificar nossa trajetória. E é nesse sentido que a pré-candidatura de Plínio aponta a necessidade de refletirmos sobre nossa prática, como marxistas que somos.
Mais que isso, Plínio se propõe a ser uma candidatura que defenda as resoluções e o programa do partido, ainda que o candidato tenha restrições de ordem pessoal a algumas questões: porque a candidatura do partido deve ser a expressão do coletivo e não de opiniões individuais.
Porque se é algo que devemos ter nesta campanha eleitoral é uma candidatura que fale o programa do partido, o que é construído de forma coletiva, e não a expressão de posições individuais, que ignoram as decisões e acordos construídos no partido.
As tarefas da candidatura do PSOL
Em muitos momentos, Martiniano acusou Plínio de ser indulgente com o PT. Para resguardar a verdade histórica e estabelecer um patamar de polêmicas fraternas entre nós, é importante registrar que Plínio propõe três tarefas centrais ao PSOL na campanha eleitoral. E a primeira delas é ser o contraponto ao PT e ao PSDB.
Se há uma figura em nosso partido que foi procurada pela mídia para fazer o balanço dos 30 anos do PT, pelo significado e o peso de sua ruptura com aquela sigla, foi Plínio Arruda Sampaio.
A utilização de frases soltas publicadas em veículos dessa mesma grande mídia para polemizar com Plínio sobre sua capacidade de polarizar com o PT é, no mínimo, desleal, para falarmos francamente entre companheiros.
Pior ainda é citar em debates frases ditas por Plínio quando estava no PT, disputando o PED (o que aglutinou a segunda leva de rupturas com aquele partido que vieram a se somar ao PSOL), como foi feito no debate do Rio de Janeiro, uma descontextualização grosseira.
A segunda tarefa central proposta por Plínio é a luta pela ampliação de nossa inserção social e pela manutenção e crescimento das nossas bancadas parlamentares. Onde está o propagandismo, sectarismo ou autoproclamação dessa proposta? Queremos ou não lutar duramente para manter os valorosos mandatos parlamentares conquistados por nosso jovem PSOL? O candidato à Presidência da República pelo PSOL deve ou não organizar sua agenda a partir desta perspectiva, assegurando para além das eleições visibilidade ao partido na luta contra os governos e o capital? Essa é a proposta concreta de Plínio Arruda Sampaio: organizar sua agenda de atividades da campanha presidencial colada às agendas, em primeiro lugar, dos atuais deputados federais e estaduais do partido para impulsionar a reeleição dos mesmos, mas também junto às demais candidaturas do PSOL para buscar ampliar a possibilidade de atuarmos nos legislativos estaduais e no Congresso Nacional em defesa dos direitos da classe trabalhadora, em oposição ao PT, ao PSDB e aos partidos que sustentam esses dois blocos de poder (incluído aí o PV da senadora Marina Silva).
A terceira tarefa proposta por Plínio é a busca pela retomada da Frente de Esquerda com o PCB e o PSTU. Obviamente essa tarefa está hoje mais difícil porque o PSOL adiou por oito meses (desde agosto do ano passado, quando realizamos nosso 2º Congresso) nossa definição de política eleitoral. Temos que compreender que a unidade se constrói também no respeito aos demais setores da esquerda, que viram de fora, assistindo pela mídia aos debates internos do PSOL, a possibilidade concreta de entrarmos nessa eleição vinculados ao PV de Zequinha Sarney, que sustenta e compõe governos em quase todos os estados da federação.
No entanto, se há alguma chance de rearticularmos a Frente de Esquerda, devemos lutar para concretiza-la. Para evitar a fragmentação dos socialistas nas eleições, para favorecer a aglutinação dos movimentos sociais combativos, para fortalecer a voz da esquerda na disputa contra a falsa polarização PT-PSDB.
Plínio Arruda Sampaio: coerência para transformar o Brasil
Vamos às ruas, construir uma campanha com capacidade convocatória sem perder a dimensão de classe, para organizar aqueles que o Estado brasileiro desorganiza. Uma campanha socialista, sem amarras com o capital, sem dinheiro de bancos, empreiteiras, multinacionais ou empresas com passivos ambientais e trabalhistas, como prevê o estatuto de nosso partido. Uma campanha anticapitalista de caráter claramente socialista.
E temos em nosso partido um nome com história, expressão na vida política brasileira, estatura para reconstruir a Frente de Esquerda, conquistar o apoio de amplos setores do MST (o maior movimento social da América Latina), atrair os setores progressistas da igreja, dialogar didaticamente com a população e conquistar corações e mentes por sua coerência e pelo vigor de sua disposição de luta em defesa da classe no auge de seus 80 anos. Um nome que, como já demonstrado internamente em nosso partido, ao reunir o apoio de seis das nove teses apresentadas à 3ª Conferência Eleitoral do PSOL (além do apoio do deputado Chico Alencar, que assina outra das nove teses), pode construir, na diversidade que é a marca fundante do PSOL (o direito das tendências se expressarem publicamente), um projeto socialista para o Brasil. Esse nome é Plínio Arruda Sampaio.
Luciana Araujo integrou o diretório nacional fundacional do PSOL, integra a direção nacional do Coletivo Socialismo e Liberdade (CSOL) e escrve para o blog de professor Cardozo5013.
SOBRE A DECISÃO DE RETIRAREM A CRUZ DOS LUGARES PÚBLICOS POR FRADE DEMETRIUS.
Sobre a decisão de retirarem a Cruz dos lugares públicos.
Eta resposta bem dada de um padre consciente.
Espalhe que esta é boa....
NOTA DEZ. Esse Frade falou em nome de todos os BRASILEIROS.
Sou Padre católico e concordo plenamente com o Ministério Público de
São Paulo, por querer retirar os símbolos religiosos das repartições
públicas..
Nosso Estado é laico e não deve favorecer esta ou aquela religião.
A Cruz deve ser retirada !
Nunca gostei de ver a Cruz em tribunais, onde os pobres têm menos
direitos que os ricos e onde sentenças são vendidas e compradas.
Não quero ver a Cruz nas Câmaras legislativas, onde a corrupção é a
moeda mais forte.
Não quero ver a Cruz em delegacias, cadeias e quartéis, onde os
pequenos são constrangidos e torturados.
Não quero ver a Cruz em prontos-socorros e hospitais, onde pessoas
(pobres) morrem sem atendimento.
É preciso retirar a Cruz das repartições públicas, porque Cristo não
abençoa a sórdida política brasileira, causa da desgraça dos pequenos
e pobres.
Frade Demetrius dos Santos Silva - São Paulo/SP
Eta resposta bem dada de um padre consciente.
Espalhe que esta é boa....
NOTA DEZ. Esse Frade falou em nome de todos os BRASILEIROS.
Sou Padre católico e concordo plenamente com o Ministério Público de
São Paulo, por querer retirar os símbolos religiosos das repartições
públicas..
Nosso Estado é laico e não deve favorecer esta ou aquela religião.
A Cruz deve ser retirada !
Nunca gostei de ver a Cruz em tribunais, onde os pobres têm menos
direitos que os ricos e onde sentenças são vendidas e compradas.
Não quero ver a Cruz nas Câmaras legislativas, onde a corrupção é a
moeda mais forte.
Não quero ver a Cruz em delegacias, cadeias e quartéis, onde os
pequenos são constrangidos e torturados.
Não quero ver a Cruz em prontos-socorros e hospitais, onde pessoas
(pobres) morrem sem atendimento.
É preciso retirar a Cruz das repartições públicas, porque Cristo não
abençoa a sórdida política brasileira, causa da desgraça dos pequenos
e pobres.
Frade Demetrius dos Santos Silva - São Paulo/SP
sexta-feira, 19 de março de 2010
EDUCAÇÃO DIREITO DE TODOS (AS).
EDUCAÇÃO DIREITO DE TODOS (AS).
Cardozo, Jeorge Luiz*
O direito à educação pública, laica, gratuita e de qualidade é condição básica para que possamos construir uma sociedade justa, pois a ela cabe o papel de formar cidadãos e cidadãs capazes não só de atuar, mas principalmente de transformar a realidade em que estão inseridos. O fim das desigualdades exige uma educação de qualidade para todos, voltada não só para o desenvolvimento tecnológico e econômico, mas principalmente humano. Dessa forma, a defesa do direito à educação é uma bandeira histórica de todos aqueles que lutam por transformações profundas em nossa sociedade, o que os coloca em choque direto com os interesses privados que dominam o capitalismo, em suas essências excludentes.
A face mais clara dessa disputa é a possibilidade de a educação ser explorada comercialmente, através de instituições privadas. Este embate esteve presente no processo Constituinte, no qual os movimentos em defesa da escola pública conquistaram importantes vitórias, como a garantia da educação como direito de todos e dever do Estado, mas também sofreram derrotas para as instituições privadas e religiosas. Luta que continuou na elaboração da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) em 1996 e na tramitação do Plano Nacional de Educação (PNE), em 2001, mas que, principalmente, se disseminou pelo interior das redes de ensino e das próprias escolas, onde projetos e programas privatizantes foram implementados pelos governos neoliberais.
Além de interesses mercantis mais explícitos, como as terceirizações de serviços e a comercialização de materiais educacionais, essa luta também assume outra dimensão: a estruturação da educação pública a partir de um modelo de gestão e produção próprio do setor privado.
As políticas educacionais e a mercantilização da educação.
Desde o início dos anos 90, o Brasil é alvo de políticas orientadas por organismos internacionais. O Banco Mundial, através de seus programas de financiamento, empreendeu nos países em desenvolvimento uma política de reformas estruturais, cujo centro é a liberação dos mercados, a redução do papel do Estado e a transformação de direitos sociais em serviços exploráveis comercialmente.
A educação nas políticas do Banco Mundial cumpre dois objetivos: constituir um nicho comercial a ser explorado, principalmente no ensino superior, e disputar ideologicamente a população para o ideário neoliberal, naturalizando os efeitos da intensificação dessas relações de mercado, buscando inclusive resignar os segmentos sociais mais excluídos. Durante a gestão de FHC, essas políticas foram aprofundadas. Com estas orientações, o ensino fundamental foi priorizado, em termos de ampliação do atendimento, ao mesmo tempo em que o ensino superior foi totalmente aberto à exploração por instituições privadas.
O esforço de universalização do ensino fundamental se deu por uma política de fundos, que levou a mudanças na relação entre os entes federados e potencializou processos de municipalização deste nível de ensino. Enquanto estados e municípios reduziam drasticamente sua atuação na educação infantil e no ensino médio, a União acabou assumindo papel meramente controlador, destinando recursos a projetos que priorizam principalmente o setor privado e o pagamento de juros da dívida pública.
Sob o discurso do combate aos processos de exclusão, provocados pelos altos índices de reprovação, é implantado um falso modelo de progressão continuada, sem preparação dos docentes ou estruturas para seu funcionamento.
Na verdade, um sistema de aprovação automática, cujo objetivo era a regularização de fluxo e a redução de custos.
Atendendo à diretriz de redução da estrutura estatal, promove-se o fechamento de escolas e a redução de pessoal, alcançados pela superlotação de salas e pela segmentação das escolas por níveis de ensino. Esse processo, além do impacto econômico, cria condições ideais para a municipalização e provoca uma fragmentação no trabalho docente, reduzindo assim também a capacidade de resistência dos professores às mudanças.
Paralela a estas ações, vemos uma ampla campanha nos meios de comunicação que procura atribuir a solução dos problemas da educação à ação voluntária da sociedade, apontando claramente para uma sistemática de desresponsabilização do Estado e de necessidade de parcerias com o setor privado.
As avaliações nas políticas neoliberais
O governo FHC inicia um processo de direcionamento do mercado educacional e de indução das políticas públicas dos estados e municípios através de exames centralizados. A criação do Provão para o ensino superior é um exemplo desta política, que abre mão de uma atuação efetiva do Estado ao mesmo tempo em que inicia a construção de um modelo competitivo em consonância com a lógica dos interesses privados.
Não demorou para que este modelo fosse reproduzido na rede estadual paulista, através do SARESP (Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar de São Paulo), iniciando uma nova etapa no avanço das políticas neoliberais: a criação de sistemas de premiação e punição. No final dos anos 90, no estado de São Paulo, os resultados do SARESP, somados aos indicadores sobre a adequação da escola aos padrões da Secretaria Estadual de Educação (SEE-SP), são utilizados para a implantação do bônus para os professores.
Inicia-se um processo de competição entre escolas e docentes, que ano a ano são seduzidos pelas exigências do governo, desconsiderando necessidades particulares das escolas e dos alunos e abrindo mão de direitos trabalhistas para obtenção de melhores prêmios.
Pela primeira vez, o caráter ideológico dessas políticas floresceu: a competição leva a um individualismo cada vez maior, ao mesmo tempo em que legitima a idéia de que as desigualdades são resultado da falta de empenho individual ou preparo dos profissionais e demais membros da comunidade.
A resistência dos professores e suas entidades impediram que estas políticas alcançassem seus objetivos de imediato. Mas pouco a pouco os mecanismos de competição foram minando a capacidade de mobilização.
A falta de compromisso com o financiamento
Para os defensores desta política não faltam recursos para a educação. Mesmo num país onde o déficit educacional é evidente: com 14,2 milhões de pessoas com 15 anos ou mais analfabetas, em que a média de anos de estudo da população mal chega a 7 anos, com 21,2% das crianças entre 4 e 5 anos não atendidas pela educação infantil e mais de 15% dos jovens de 15 a 17 anos fora do ensino médio. O gasto público com educação estacionou em torno de 4% do PIB há mais de uma década. Em países desenvolvidos a média é de mais de 6%. Para o Brasil avançar na qualidade da educação precisaria investir por vários anos algo em torno de 10% do PIB.
Além disso, mecanismos como o FUNDEB, que em tese assegurariam recursos para o atendimento da educação básica, sofrem diretamente os efeitos dessa política que prioriza o setor financeiro em detrimento das áreas sociais, tendo seu montante reduzido através da DRU (Desvinculação de Receitas da União) e também pela significativa concessão de isenções fiscais que afetam a arrecadação.
Só neste ano, 9,2 bilhões de reais evaporaram das receitas dos fundos estaduais que formam o FUNDEB. É esta situação que levou nosso mandato a apresentar o Projeto de Lei n° 6266/2009, que obriga a União, Estados e Municípios a reporem os recursos perdidos em função das renúncias fiscais.
A implantação do sistema meritocrático
Em São Paulo, a política de bônus, aplicada há quase 10 anos, precarizou ainda mais a carreira docente, provocando uma grande estagnação salarial.
Somada a um quadro no qual grande parte dos professores são temporários, pela insuficiência de concursos, resultou nas condições para que a Secretaria iniciasse a implantação da chamada valorização por mérito.
O primeiro passo foi estabelecer, em 2008, uma prova para a contratação de professores temporários, utilizando os resultados para fazer campanha de ataques aos professores nos meios de comunicação. Divulgando dados parciais, a então secretária Maria Helena Castro passou para a população a imagem de que os docentes não eram capazes de responder às questões da prova, achando um bode expiatório para os problemas de qualidade na educação paulista, ao mesmo tempo em que apontava a solução: premiar alguns para estimular ainda mais a competição.
Em seguida, o governo apresenta um novo regime para os professores temporários, que só poderão ser contratados por um ano, cumprindo um interstício de 200 dias para nova contratação, além de não terem os mesmos direitos dos outros profissionais no que diz respeito a licenças, faltas e benefícios. A provinha ganha caráter eliminatório para aqueles que iniciaram na rede depois da criação do SPPrev, em junho de 2007. Professores temporários que ingressaram antes ganharam uma estabilidade, com um mínimo de horas semanais, mas se não forem bem na provinha não poderão dar aulas.
Ao mesmo tempo, são tomadas medidas que modificam totalmente a carreira do magistério no estado. São criadas duas novas jornadas, uma de 12 e outra de 40 horas semanais, e estipula-se que os novos concursos terão uma nova fase, com caráter eliminatório, que consiste num curso de formação de 4 meses. Estas medidas mostram duas coisas: a fragmentação do trabalho, incentivando a alta rotatividade de professores nas escolas, e também uma ação para enquadramento e doutrinação dos professores, barrando aqueles que são críticos às propostas impostas.
A competição por melhores salários
Com a aprovação do PLC 29/2009, o governo Serra alterou de forma drástica a carreira do magistério, vinculando a evolução salarial dos professores ao seu desempenho em exames aplicados periodicamente, implementando na prática um sistema de diferenciação e segmentação.
A lei aprovada estipula que a evolução nas faixas salariais se dará pelo cumprimento de requisitos e pela classificação no exame, a depender da disponibilidade orçamentária. Para alcançar a promoção para uma nova faixa, o professor deve cumprir um interstício de três anos entre cada evolução, permanecer na mesma escola por 80% desse período, ter freqüência compatível com critério a ser estipulado pela SEE, ultrapassar no exame a nota mínima estipulada para cada faixa e estar entre os 20% de sua faixa salarial que tiveram melhores notas.
Neste processo, o governo faz uma propaganda enganosa, passando a idéia de que os profissionais da educação serão valorizados, podendo alcançar altos salários, de que suas condições de trabalho estão cada vez melhores e, principalmente, de que está investindo na educação, quando na verdade empurra os profissionais para a lógica de competição, subordinando a superação dos problemas ao seu esforço e dedicação pessoal, ignorando todas as questões estruturais do sistema e, ao mesmo tempo, renovando o velho discurso de que os problemas seriam causados pela incompetência e supostos má qualidade dos profissionais, como aparece freqüentemente nas palavras do atual secretário Paulo Renato Souza (o mesmo que foi ministro de FHC da educação e ajudou a implementar essas políticas neoliberais na educação e, agora, faz o mesmo como secretario estadual por São Paulo).
Essa mudança na carreira vai além das questões de mérito e apresenta um instrumento que não se destina apenas a estimular a competição, mas sim a criar uma elite dentro do professorado. É um sistema de ranking; uma corrida pelos melhores lugares, com o nítido objetivo de tentar ludibriar a opinião pública e dividir a categoria.
Ao estabelecer, por critérios meramente financeiros, que até 20% poderão receber o reajuste, fica evidente que tal medida não tem de fato nenhum compromisso com a qualidade da educação: mesmo que todos os profissionais da rede atinjam um excelente resultado, no máximo 20% deles serão premiados. Ou seja, é um vestibular para os melhores salários.
Portanto, trata-se de uma desestruturação da carreira, uma justificativa para a estagnação salarial da grande maioria dos professores, que inclusive vai contra a isonomia salarial e joga na lata do lixo todo o acúmulo e conhecimento dos profissionais que por vários anos se dedicaram à rede.
Mesmo medidas que poderiam significar um avanço na carreira dos profissionais foram barradas, como é o caso do Piso Nacional do Magistério, que garantia que 1/3 da jornada seriam reservados para o trabalho pedagógico e de preparação das aulas, e que até hoje não foi implementado em função de ação judicial de governadores do PSDB e DEM.
Um sistema que retira a autonomia da escola e do professor.
Além do ataque direto aos profissionais do magistério, o governo paulista também implementou no último período uma série de programas que afetam profundamente os currículos e o funcionamento das escolas. A adoção de apostilas e materiais padronizados, distribuídos de forma fracionada ao longo dos bimestres e vinculados diretamente aos exames do SARESP, obriga o professor a se enquadrar na proposta, ignorando as especificidades de cada escola, as diferenças regionais ou mesmo a possibilidade de a escola desenvolver um percurso mais adequado ao perfil dos seus alunos.
A padronização, a partir de uma proposta curricular rebaixada, ignora a necessidade de organização do trabalho escolar a partir de um projeto político pedagógico, construído de forma autônoma e coletiva. E transforma o trabalho docente em ato mecânico e incapaz de responder às várias dinâmicas que se desenvolvem no dia-a-dia de uma escola.
O discurso neoliberal justifica essa padronização sob argumentos baseados em uma técnica, supostamente única e inquestionável, balizada exclusivamente pelo enquadramento nas estatísticas fornecidas pelas avaliações, que por sua vez atendem a uma lógica mercantil e quantitativa.
Temos assim um cenário totalitário, no qual o professor é coagido a se submeter à proposta oficial e os Conselhos de Classe e o Conselho de Escola funcionam burocraticamente para justificar, apenas no discurso, a gestão democrática da escola, cuja única autonomia é para a procura de parceiros que supram necessidades esquecidas pelo Estado. De seu lado, os estudantes desse sistema são como recipientes vazios, nos quais serão depositados os conhecimentos, como tão bem descreveu Paulo Freire, modelados para aceitarem e cumprirem seus papéis no sistema, ou fora dele, de acordo com as necessidades impostas pelo mercado. É um sistema injusto e excludente, com conseqüências gravíssimas a médio e longo prazo.
Como resultado da precarização das instalações escolares e da desigualdade social, chegamos a um cenário no qual predomina a desagregação, a intolerância, a violência, o medo e a barbárie, já instalada em muitas de nossas escolas, o que também é cinicamente ignorado pelo Poder Público.
A meritocracia no governo Lula
O governo Lula frustrou as expectativas dos profissionais da educação, das entidades representativas e dos movimentos organizados, que durante os anos 90 resistiram ao avanço das políticas neoliberais e combateram os processos de mercantilização da educação. Todo o acúmulo alcançado na luta pela Lei de Diretrizes e Bases e na construção do Plano Nacional de Educação foi colocado em xeque a partir do momento em que o governo não assumiu uma postura de mudança diante das medidas do governo FHC.
Maior exemplo disso é a manutenção dos vetos aos artigos do PNE que implicavam compromisso financeiro com a educação. Isso levou direções sindicais e dos movimentos a vacilarem diante de lutas históricas, abrindo de forma decisiva um espaço para a consolidação de políticas privatizantes, em especial em São Paulo. Situação esta que ficou ainda pior com a adesão do governo petista ao modelo baseado em sistemas de avaliação e ao discurso da competitividade e do mérito, levando à elaboração de programas que aperfeiçoam e aprofundam as políticas neoliberais na educação. É só ver como o governo Wagner tem tratado a educação aqui em nosso estado, contratando professores através do Regime de Direito Administrativo (REDA), e, desrespeitando até concurso já realizado.
Setores da mídia também se mostram aliados importantes na defesa da meritocracia, disseminando falsas idéias sobre a educação pública, tendo como contrapartida enormes benefícios financeiros. Um exemplo são os contratos milionários, realizados sem licitação, entre o governo do Estado de São Paulo e a Editora Abril. Um deles, de assinaturas da revista Nova Escola, foi denunciado pelo nosso mandato no Ministério Público Estadual e agora é alvo de ação judicial por improbidade administrativa.
O resgate da educação pública como direito e da escola como espaço de construção coletiva.
A meritocracia deveria ser a forma de governo na qual as posições hierárquicas são conquistadas, em tese, com base no merecimento e não por fatores como riqueza, classe social, raça ou religião. Um exemplo seria a idéia de concurso público, na qual as pessoas podem disputar um cargo em condições iguais. Entretanto, a palavra meritocracia é agora freqüentemente usada para descrever um tipo de sociedade onde riqueza, renda e classe social são designadas por competição, assumindo-se que os vencedores, de fato, merecem tais vantagens. Ou seja, as desigualdades são justificadas e ampliadas, gerando sociedades agressivamente competitivas, com grandes diferenças de renda e riqueza.
Esse modelo vai na contramão daquele que defendemos. A educação não pode ser transformada em produto, tampouco nossas escolas podem ser transformadas em fábricas. A educação é, antes de tudo, um direito. Sua qualidade não está relacionada a uma idéia de produção quantitativa, e por17 tanto não podemos confundi-la com o atendimento de padrões e estatísticas.
A formação de nossos jovens é algo muito mais complexo, exigente e dialético e a análise da qualidade da educação deve levar em conta seu papel social e que transformações sociais queremos.
É fundamental, assim, avançarmos na melhoria das condições de trabalho e de formação dos profissionais da educação. Falamos aqui de uma real valorização destes profissionais, materializada na estruturação das carreiras; na garantia de salários dignos; de jornadas compatíveis com a necessidade de tempo para pesquisa, estudo e planejamento do trabalho; no acesso a programas de formação continuada e aperfeiçoamento; na garantia de um número adequado de alunos por turmas; na adequação e estruturação física dos espaços de trabalho; e na autonomia didático-pedagógica. Também é fundamental que se estabeleça, de fato, a gestão democrática das escolas, com Conselhos escolares autônomos, com poder para formular e implementar projetos político-pedagógicos. (Ver artigo de Professor Cardozo neste blog que fala mais sobre o tema).
Por fim, a educação pública só será prioridade se materializada num consistente financiamento, atendendo pelo menos aos objetivos que foram traçados há dez anos pelo Plano Nacional de Educação – Proposta da Sociedade, de termos 10% do Produto Interno Bruto destinado à educação.
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Jeorge Luiz Cardozo – Professor da Faculdade Dom Luiz, Graduado em Filosofia (UCSAL/2000), Especialista em Educação (UNEB/2003) e Assessor Técnico da Secretaria Municipal de Educação de Salvador.
Cardozo, Jeorge Luiz*
O direito à educação pública, laica, gratuita e de qualidade é condição básica para que possamos construir uma sociedade justa, pois a ela cabe o papel de formar cidadãos e cidadãs capazes não só de atuar, mas principalmente de transformar a realidade em que estão inseridos. O fim das desigualdades exige uma educação de qualidade para todos, voltada não só para o desenvolvimento tecnológico e econômico, mas principalmente humano. Dessa forma, a defesa do direito à educação é uma bandeira histórica de todos aqueles que lutam por transformações profundas em nossa sociedade, o que os coloca em choque direto com os interesses privados que dominam o capitalismo, em suas essências excludentes.
A face mais clara dessa disputa é a possibilidade de a educação ser explorada comercialmente, através de instituições privadas. Este embate esteve presente no processo Constituinte, no qual os movimentos em defesa da escola pública conquistaram importantes vitórias, como a garantia da educação como direito de todos e dever do Estado, mas também sofreram derrotas para as instituições privadas e religiosas. Luta que continuou na elaboração da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) em 1996 e na tramitação do Plano Nacional de Educação (PNE), em 2001, mas que, principalmente, se disseminou pelo interior das redes de ensino e das próprias escolas, onde projetos e programas privatizantes foram implementados pelos governos neoliberais.
Além de interesses mercantis mais explícitos, como as terceirizações de serviços e a comercialização de materiais educacionais, essa luta também assume outra dimensão: a estruturação da educação pública a partir de um modelo de gestão e produção próprio do setor privado.
As políticas educacionais e a mercantilização da educação.
Desde o início dos anos 90, o Brasil é alvo de políticas orientadas por organismos internacionais. O Banco Mundial, através de seus programas de financiamento, empreendeu nos países em desenvolvimento uma política de reformas estruturais, cujo centro é a liberação dos mercados, a redução do papel do Estado e a transformação de direitos sociais em serviços exploráveis comercialmente.
A educação nas políticas do Banco Mundial cumpre dois objetivos: constituir um nicho comercial a ser explorado, principalmente no ensino superior, e disputar ideologicamente a população para o ideário neoliberal, naturalizando os efeitos da intensificação dessas relações de mercado, buscando inclusive resignar os segmentos sociais mais excluídos. Durante a gestão de FHC, essas políticas foram aprofundadas. Com estas orientações, o ensino fundamental foi priorizado, em termos de ampliação do atendimento, ao mesmo tempo em que o ensino superior foi totalmente aberto à exploração por instituições privadas.
O esforço de universalização do ensino fundamental se deu por uma política de fundos, que levou a mudanças na relação entre os entes federados e potencializou processos de municipalização deste nível de ensino. Enquanto estados e municípios reduziam drasticamente sua atuação na educação infantil e no ensino médio, a União acabou assumindo papel meramente controlador, destinando recursos a projetos que priorizam principalmente o setor privado e o pagamento de juros da dívida pública.
Sob o discurso do combate aos processos de exclusão, provocados pelos altos índices de reprovação, é implantado um falso modelo de progressão continuada, sem preparação dos docentes ou estruturas para seu funcionamento.
Na verdade, um sistema de aprovação automática, cujo objetivo era a regularização de fluxo e a redução de custos.
Atendendo à diretriz de redução da estrutura estatal, promove-se o fechamento de escolas e a redução de pessoal, alcançados pela superlotação de salas e pela segmentação das escolas por níveis de ensino. Esse processo, além do impacto econômico, cria condições ideais para a municipalização e provoca uma fragmentação no trabalho docente, reduzindo assim também a capacidade de resistência dos professores às mudanças.
Paralela a estas ações, vemos uma ampla campanha nos meios de comunicação que procura atribuir a solução dos problemas da educação à ação voluntária da sociedade, apontando claramente para uma sistemática de desresponsabilização do Estado e de necessidade de parcerias com o setor privado.
As avaliações nas políticas neoliberais
O governo FHC inicia um processo de direcionamento do mercado educacional e de indução das políticas públicas dos estados e municípios através de exames centralizados. A criação do Provão para o ensino superior é um exemplo desta política, que abre mão de uma atuação efetiva do Estado ao mesmo tempo em que inicia a construção de um modelo competitivo em consonância com a lógica dos interesses privados.
Não demorou para que este modelo fosse reproduzido na rede estadual paulista, através do SARESP (Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar de São Paulo), iniciando uma nova etapa no avanço das políticas neoliberais: a criação de sistemas de premiação e punição. No final dos anos 90, no estado de São Paulo, os resultados do SARESP, somados aos indicadores sobre a adequação da escola aos padrões da Secretaria Estadual de Educação (SEE-SP), são utilizados para a implantação do bônus para os professores.
Inicia-se um processo de competição entre escolas e docentes, que ano a ano são seduzidos pelas exigências do governo, desconsiderando necessidades particulares das escolas e dos alunos e abrindo mão de direitos trabalhistas para obtenção de melhores prêmios.
Pela primeira vez, o caráter ideológico dessas políticas floresceu: a competição leva a um individualismo cada vez maior, ao mesmo tempo em que legitima a idéia de que as desigualdades são resultado da falta de empenho individual ou preparo dos profissionais e demais membros da comunidade.
A resistência dos professores e suas entidades impediram que estas políticas alcançassem seus objetivos de imediato. Mas pouco a pouco os mecanismos de competição foram minando a capacidade de mobilização.
A falta de compromisso com o financiamento
Para os defensores desta política não faltam recursos para a educação. Mesmo num país onde o déficit educacional é evidente: com 14,2 milhões de pessoas com 15 anos ou mais analfabetas, em que a média de anos de estudo da população mal chega a 7 anos, com 21,2% das crianças entre 4 e 5 anos não atendidas pela educação infantil e mais de 15% dos jovens de 15 a 17 anos fora do ensino médio. O gasto público com educação estacionou em torno de 4% do PIB há mais de uma década. Em países desenvolvidos a média é de mais de 6%. Para o Brasil avançar na qualidade da educação precisaria investir por vários anos algo em torno de 10% do PIB.
Além disso, mecanismos como o FUNDEB, que em tese assegurariam recursos para o atendimento da educação básica, sofrem diretamente os efeitos dessa política que prioriza o setor financeiro em detrimento das áreas sociais, tendo seu montante reduzido através da DRU (Desvinculação de Receitas da União) e também pela significativa concessão de isenções fiscais que afetam a arrecadação.
Só neste ano, 9,2 bilhões de reais evaporaram das receitas dos fundos estaduais que formam o FUNDEB. É esta situação que levou nosso mandato a apresentar o Projeto de Lei n° 6266/2009, que obriga a União, Estados e Municípios a reporem os recursos perdidos em função das renúncias fiscais.
A implantação do sistema meritocrático
Em São Paulo, a política de bônus, aplicada há quase 10 anos, precarizou ainda mais a carreira docente, provocando uma grande estagnação salarial.
Somada a um quadro no qual grande parte dos professores são temporários, pela insuficiência de concursos, resultou nas condições para que a Secretaria iniciasse a implantação da chamada valorização por mérito.
O primeiro passo foi estabelecer, em 2008, uma prova para a contratação de professores temporários, utilizando os resultados para fazer campanha de ataques aos professores nos meios de comunicação. Divulgando dados parciais, a então secretária Maria Helena Castro passou para a população a imagem de que os docentes não eram capazes de responder às questões da prova, achando um bode expiatório para os problemas de qualidade na educação paulista, ao mesmo tempo em que apontava a solução: premiar alguns para estimular ainda mais a competição.
Em seguida, o governo apresenta um novo regime para os professores temporários, que só poderão ser contratados por um ano, cumprindo um interstício de 200 dias para nova contratação, além de não terem os mesmos direitos dos outros profissionais no que diz respeito a licenças, faltas e benefícios. A provinha ganha caráter eliminatório para aqueles que iniciaram na rede depois da criação do SPPrev, em junho de 2007. Professores temporários que ingressaram antes ganharam uma estabilidade, com um mínimo de horas semanais, mas se não forem bem na provinha não poderão dar aulas.
Ao mesmo tempo, são tomadas medidas que modificam totalmente a carreira do magistério no estado. São criadas duas novas jornadas, uma de 12 e outra de 40 horas semanais, e estipula-se que os novos concursos terão uma nova fase, com caráter eliminatório, que consiste num curso de formação de 4 meses. Estas medidas mostram duas coisas: a fragmentação do trabalho, incentivando a alta rotatividade de professores nas escolas, e também uma ação para enquadramento e doutrinação dos professores, barrando aqueles que são críticos às propostas impostas.
A competição por melhores salários
Com a aprovação do PLC 29/2009, o governo Serra alterou de forma drástica a carreira do magistério, vinculando a evolução salarial dos professores ao seu desempenho em exames aplicados periodicamente, implementando na prática um sistema de diferenciação e segmentação.
A lei aprovada estipula que a evolução nas faixas salariais se dará pelo cumprimento de requisitos e pela classificação no exame, a depender da disponibilidade orçamentária. Para alcançar a promoção para uma nova faixa, o professor deve cumprir um interstício de três anos entre cada evolução, permanecer na mesma escola por 80% desse período, ter freqüência compatível com critério a ser estipulado pela SEE, ultrapassar no exame a nota mínima estipulada para cada faixa e estar entre os 20% de sua faixa salarial que tiveram melhores notas.
Neste processo, o governo faz uma propaganda enganosa, passando a idéia de que os profissionais da educação serão valorizados, podendo alcançar altos salários, de que suas condições de trabalho estão cada vez melhores e, principalmente, de que está investindo na educação, quando na verdade empurra os profissionais para a lógica de competição, subordinando a superação dos problemas ao seu esforço e dedicação pessoal, ignorando todas as questões estruturais do sistema e, ao mesmo tempo, renovando o velho discurso de que os problemas seriam causados pela incompetência e supostos má qualidade dos profissionais, como aparece freqüentemente nas palavras do atual secretário Paulo Renato Souza (o mesmo que foi ministro de FHC da educação e ajudou a implementar essas políticas neoliberais na educação e, agora, faz o mesmo como secretario estadual por São Paulo).
Essa mudança na carreira vai além das questões de mérito e apresenta um instrumento que não se destina apenas a estimular a competição, mas sim a criar uma elite dentro do professorado. É um sistema de ranking; uma corrida pelos melhores lugares, com o nítido objetivo de tentar ludibriar a opinião pública e dividir a categoria.
Ao estabelecer, por critérios meramente financeiros, que até 20% poderão receber o reajuste, fica evidente que tal medida não tem de fato nenhum compromisso com a qualidade da educação: mesmo que todos os profissionais da rede atinjam um excelente resultado, no máximo 20% deles serão premiados. Ou seja, é um vestibular para os melhores salários.
Portanto, trata-se de uma desestruturação da carreira, uma justificativa para a estagnação salarial da grande maioria dos professores, que inclusive vai contra a isonomia salarial e joga na lata do lixo todo o acúmulo e conhecimento dos profissionais que por vários anos se dedicaram à rede.
Mesmo medidas que poderiam significar um avanço na carreira dos profissionais foram barradas, como é o caso do Piso Nacional do Magistério, que garantia que 1/3 da jornada seriam reservados para o trabalho pedagógico e de preparação das aulas, e que até hoje não foi implementado em função de ação judicial de governadores do PSDB e DEM.
Um sistema que retira a autonomia da escola e do professor.
Além do ataque direto aos profissionais do magistério, o governo paulista também implementou no último período uma série de programas que afetam profundamente os currículos e o funcionamento das escolas. A adoção de apostilas e materiais padronizados, distribuídos de forma fracionada ao longo dos bimestres e vinculados diretamente aos exames do SARESP, obriga o professor a se enquadrar na proposta, ignorando as especificidades de cada escola, as diferenças regionais ou mesmo a possibilidade de a escola desenvolver um percurso mais adequado ao perfil dos seus alunos.
A padronização, a partir de uma proposta curricular rebaixada, ignora a necessidade de organização do trabalho escolar a partir de um projeto político pedagógico, construído de forma autônoma e coletiva. E transforma o trabalho docente em ato mecânico e incapaz de responder às várias dinâmicas que se desenvolvem no dia-a-dia de uma escola.
O discurso neoliberal justifica essa padronização sob argumentos baseados em uma técnica, supostamente única e inquestionável, balizada exclusivamente pelo enquadramento nas estatísticas fornecidas pelas avaliações, que por sua vez atendem a uma lógica mercantil e quantitativa.
Temos assim um cenário totalitário, no qual o professor é coagido a se submeter à proposta oficial e os Conselhos de Classe e o Conselho de Escola funcionam burocraticamente para justificar, apenas no discurso, a gestão democrática da escola, cuja única autonomia é para a procura de parceiros que supram necessidades esquecidas pelo Estado. De seu lado, os estudantes desse sistema são como recipientes vazios, nos quais serão depositados os conhecimentos, como tão bem descreveu Paulo Freire, modelados para aceitarem e cumprirem seus papéis no sistema, ou fora dele, de acordo com as necessidades impostas pelo mercado. É um sistema injusto e excludente, com conseqüências gravíssimas a médio e longo prazo.
Como resultado da precarização das instalações escolares e da desigualdade social, chegamos a um cenário no qual predomina a desagregação, a intolerância, a violência, o medo e a barbárie, já instalada em muitas de nossas escolas, o que também é cinicamente ignorado pelo Poder Público.
A meritocracia no governo Lula
O governo Lula frustrou as expectativas dos profissionais da educação, das entidades representativas e dos movimentos organizados, que durante os anos 90 resistiram ao avanço das políticas neoliberais e combateram os processos de mercantilização da educação. Todo o acúmulo alcançado na luta pela Lei de Diretrizes e Bases e na construção do Plano Nacional de Educação foi colocado em xeque a partir do momento em que o governo não assumiu uma postura de mudança diante das medidas do governo FHC.
Maior exemplo disso é a manutenção dos vetos aos artigos do PNE que implicavam compromisso financeiro com a educação. Isso levou direções sindicais e dos movimentos a vacilarem diante de lutas históricas, abrindo de forma decisiva um espaço para a consolidação de políticas privatizantes, em especial em São Paulo. Situação esta que ficou ainda pior com a adesão do governo petista ao modelo baseado em sistemas de avaliação e ao discurso da competitividade e do mérito, levando à elaboração de programas que aperfeiçoam e aprofundam as políticas neoliberais na educação. É só ver como o governo Wagner tem tratado a educação aqui em nosso estado, contratando professores através do Regime de Direito Administrativo (REDA), e, desrespeitando até concurso já realizado.
Setores da mídia também se mostram aliados importantes na defesa da meritocracia, disseminando falsas idéias sobre a educação pública, tendo como contrapartida enormes benefícios financeiros. Um exemplo são os contratos milionários, realizados sem licitação, entre o governo do Estado de São Paulo e a Editora Abril. Um deles, de assinaturas da revista Nova Escola, foi denunciado pelo nosso mandato no Ministério Público Estadual e agora é alvo de ação judicial por improbidade administrativa.
O resgate da educação pública como direito e da escola como espaço de construção coletiva.
A meritocracia deveria ser a forma de governo na qual as posições hierárquicas são conquistadas, em tese, com base no merecimento e não por fatores como riqueza, classe social, raça ou religião. Um exemplo seria a idéia de concurso público, na qual as pessoas podem disputar um cargo em condições iguais. Entretanto, a palavra meritocracia é agora freqüentemente usada para descrever um tipo de sociedade onde riqueza, renda e classe social são designadas por competição, assumindo-se que os vencedores, de fato, merecem tais vantagens. Ou seja, as desigualdades são justificadas e ampliadas, gerando sociedades agressivamente competitivas, com grandes diferenças de renda e riqueza.
Esse modelo vai na contramão daquele que defendemos. A educação não pode ser transformada em produto, tampouco nossas escolas podem ser transformadas em fábricas. A educação é, antes de tudo, um direito. Sua qualidade não está relacionada a uma idéia de produção quantitativa, e por17 tanto não podemos confundi-la com o atendimento de padrões e estatísticas.
A formação de nossos jovens é algo muito mais complexo, exigente e dialético e a análise da qualidade da educação deve levar em conta seu papel social e que transformações sociais queremos.
É fundamental, assim, avançarmos na melhoria das condições de trabalho e de formação dos profissionais da educação. Falamos aqui de uma real valorização destes profissionais, materializada na estruturação das carreiras; na garantia de salários dignos; de jornadas compatíveis com a necessidade de tempo para pesquisa, estudo e planejamento do trabalho; no acesso a programas de formação continuada e aperfeiçoamento; na garantia de um número adequado de alunos por turmas; na adequação e estruturação física dos espaços de trabalho; e na autonomia didático-pedagógica. Também é fundamental que se estabeleça, de fato, a gestão democrática das escolas, com Conselhos escolares autônomos, com poder para formular e implementar projetos político-pedagógicos. (Ver artigo de Professor Cardozo neste blog que fala mais sobre o tema).
Por fim, a educação pública só será prioridade se materializada num consistente financiamento, atendendo pelo menos aos objetivos que foram traçados há dez anos pelo Plano Nacional de Educação – Proposta da Sociedade, de termos 10% do Produto Interno Bruto destinado à educação.
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Jeorge Luiz Cardozo – Professor da Faculdade Dom Luiz, Graduado em Filosofia (UCSAL/2000), Especialista em Educação (UNEB/2003) e Assessor Técnico da Secretaria Municipal de Educação de Salvador.
A FARSA DA PROPOSTA INIVADORA DO MEC PARA A EDUCAÇÃO.
A FARSA DA PROPOSTA INOVADORA DO MEC PARA A EDUCAÇÃO.
Cardozo, Jeorge Luiz*.
Contam-nos as estatísticas que uma enormidade de jovens mal chega ao ensino médio e, entre eles, outra enormidade abandona a escola sem completar seus estudos. Além disso, a qualidade do ensino deixa a desejar, a considerar o desempenho dos alunos nas diversas avaliações a que são submetidos. Nada disso é novo.
O Ministério da Educação então anunciou uma mudança profunda na concepção curricular, a partir de um programa denominado “ensino médio inovador”. Não foi sem alarde que a imprensa divulgou as mudanças vindouras, anunciando-as como uma “reforma do ensino médio”. Quando a sociedade percebe que a “educação vai mal e a escola pública, pior”, apresentar qualquer proposta a título de “inovação” é coisa que se faz de caso pensado: a idéia é sempre simpática, pois advoga o “novo”, e faz considerar qualquer oposição ou resistência como “velha”, “reacionária”, “atrasada”. Trata-se de um recurso retórico preciso e eficaz, apesar de amplamente repetido: nova república, nova escola, nova ordem mundial.
Muito barulho por pouco
Contudo, a proposta é menor do que parece: trata-se de um programa de financiamento a projetos pedagógicos experimentais em escolas que encampem um currículo “inovador”, segundo certos pressupostos didáticos e metodológicos. Ademais, no primeiro ano, só cem escolas serão contempladas no Brasil todo, um número muito reduzido para que se tenha qualquer impacto sensível.
O MEC quer induzir assim as políticas educacionais praticadas pelos Estados, majoritariamente responsáveis pelo ensino médio, sem que estes ofereçam as condições necessárias nem recursos financeiros adicionais.
Neste quesito, o governo Lula repete os equívocos do governo anterior. Ao pretender uma reforma, apresenta medidas isoladas e dispersas, que assim até representariam avanços, mas que são neutralizadas por omissões e recuos na política educacional implementada e, ao não darem respostas satisfatórias aos problemas apresentados, os aprofundam ainda mais.
O sentido da “inovação”
A questão é saber como, nas atuais circunstâncias, repercutirão para dentro das escolas as “inovações” que o programa sugere. Partem das alturas das concepções curriculares, sem garantir no chão da escola as condições necessárias para o currículo proposto. Ora, o programa apresentado se fundamenta nos Parâmetros Curriculares Nacionais que, não por acaso, após mais de 10 anos ficaram no papel: nas escolas ainda não se vê um tratamento às “matérias” de modo que os conteúdos curriculares estivessem integrados, promovendo uma desejável abordagem interdisciplinar; permanece a tradição das disciplinas estanques.
A imprensa noticiou ainda que a intenção do MEC fosse a de eliminar as 12 disciplinas atuais, agrupando os conteúdos curriculares em quatro grupos mais amplos, por áreas de conhecimento afins. Porém, como as aulas serão atribuídas aos professores, especialistas que são em disciplinas específicas?
Não é por acaso que os sindicatos voltaram-se a este ponto em particular, acerca da “empregabilidade” do professor, a despeito de qualquer consideração metodológica. Em tempos de contenção de recursos, isso pode se configurar em estratégia sistemática de demissões.
A proposta ainda amplia a carga horária para três mil horas, 600 horas a mais que serão destinadas a atividades de livre escolha dos alunos, sem deixar claro quem será responsável por ministrar tais atividades. Em tempos de privatização e terceirização, isso pode servir de expediente para toda espécie de “parcerias” público-privadas, em detrimento da atuação dos professores.
Mais do mesmo
A “inovação” aqui vem mal disfarçada, reforçando o grande consenso construído em torno da “pedagogia da competência”, ao conceber o processo educativo a partir do desenvolvimento de competências e habilidades, mesuráveis em níveis, aquém ou além do adequado — sobretudo porque possibilitam, a despeito da diversidade entre as escolas, comparar resultados a partir de avaliações de desempenho nacionais e padronizadas. Em resumo, da “inovação” da pedagogia oficial decorre o atual sistema de avaliação, dos mesmos discursos e práticas que se repetem, com nuances, do PT ao PSDB, de mais provinhas e provões.
A que se deve esta “resistência à inovação”, já que nada há na proposta que estivesse antes legalmente impedido de ser feito? A resposta, a mais difundida, à esquerda e à direita, num lamentável consenso, é a da (má) formação dos professores, responsabilizados assim pelo fracasso sistêmico da educação nacional.
Se as estatísticas não se alterarem, então a culpa é dos professores? Segundo deduzimos do empenho retórico dos gestores da política educacional, a “inovação” é uma questão de “mérito”; porque também aferido em provas, ele é isolado de outras variáveis que incidem sobre a escolarização. Mérito, assim, é tão somente a adesão, mais ou menos voluntária, do professor ao programa estabelecido.
Faltam, entretanto as condições para que docentes até se apropriem das orientações curriculares e as transformem em práticas de sala de aula. E se o desempenho em uma avaliação resulta em qualquer ganho pecuniário (para a escola ou para o professor), melhor é fazer com que os alunos obtenham “bons resultados” – o que não é necessariamente, o mesmo que ter aprendido. Converte-se o processo educativo em produção de resultados pré-estabelecidos, lançados nas estatísticas como “melhoria da qualidade”. A sanha em avaliar dá a tônica das políticas educacionais nos últimos 10 anos, como se a crise existisse nas estatísticas, mas não no chão da escola. A “reforma” e toda a política educacional parecem esquecer-se da escola; visam produzir resultados positivos nas avaliações e a partir delas.
Velho contraponto, ainda necessário
Paradoxalmente, o real sentido de uma reforma e da inovação no ensino seria antes atender às “velhas” reivindicações dos profissionais da educação, sem o que toda “inovação” é meramente retórica.
Qualquer experimentação pedagógica que pretenda uma abordagem interdisciplinar requer tempo para a discussão entre os professores a fim de afinar os encaminhamentos adotados, planejar o processo e sua avaliação, bem como para atualização e formação contínua. Isso também tem a ver com o grau de autonomia da escola, para que ela paute e trabalhe a partir de suas especificidades. Estas condições são de tal modo imperativo que, caso não sejam satisfeitas, toda experimentação dependerá da sorte e do acaso para vingarem em boas experiências, ou redundarão na frustração das tentativas, em equívocos quanto a concepções e encaminhamentos práticos, em práticas meramente protocolares, de repetição da cartilha adotada.
Se o projeto aposta ainda na multiplicidade de trajetórias para os alunos é necessário estabelecer um número adequado de alunos por sala de aula e, além disso, um número limite de turmas a que um professor se dedica. Essas são variáveis esquecidas nas discussões sobre qualidade do ensino, quando não são rechaçadas pela tecnocracia federal, estadual ou municipal, como se isso não tivesse influência no desempenho dos alunos.
E para tudo isto, deveríamos saltar dos atuais 4 nem 5% do PIB de investimento público em educação para o mínimo de 7, senão 10%, como preconizado no nosso Plano Nacional de Educação. A expectativa de um aumento significativo de recursos, inscrita no programa de governo de Lula em 2002, não se tornou real compromisso e ficou como uma amarga nostalgia. Possibilidades são criadas nas opções políticas adotadas e, lamentavelmente, optou-se uma “inovadora continuidade”, sem a ousadia necessária para que de fato inovássemos.
* Jeorge Luiz Cardozo - É Professor da Faculdade Dom Luiz, Graduado em Filosofia (UCSAL/2000), Especialista em Educação (UNEB/2003) e Assessor Técnico da Secretaria Municipal de Educação de Salvador.
Cardozo, Jeorge Luiz*.
Contam-nos as estatísticas que uma enormidade de jovens mal chega ao ensino médio e, entre eles, outra enormidade abandona a escola sem completar seus estudos. Além disso, a qualidade do ensino deixa a desejar, a considerar o desempenho dos alunos nas diversas avaliações a que são submetidos. Nada disso é novo.
O Ministério da Educação então anunciou uma mudança profunda na concepção curricular, a partir de um programa denominado “ensino médio inovador”. Não foi sem alarde que a imprensa divulgou as mudanças vindouras, anunciando-as como uma “reforma do ensino médio”. Quando a sociedade percebe que a “educação vai mal e a escola pública, pior”, apresentar qualquer proposta a título de “inovação” é coisa que se faz de caso pensado: a idéia é sempre simpática, pois advoga o “novo”, e faz considerar qualquer oposição ou resistência como “velha”, “reacionária”, “atrasada”. Trata-se de um recurso retórico preciso e eficaz, apesar de amplamente repetido: nova república, nova escola, nova ordem mundial.
Muito barulho por pouco
Contudo, a proposta é menor do que parece: trata-se de um programa de financiamento a projetos pedagógicos experimentais em escolas que encampem um currículo “inovador”, segundo certos pressupostos didáticos e metodológicos. Ademais, no primeiro ano, só cem escolas serão contempladas no Brasil todo, um número muito reduzido para que se tenha qualquer impacto sensível.
O MEC quer induzir assim as políticas educacionais praticadas pelos Estados, majoritariamente responsáveis pelo ensino médio, sem que estes ofereçam as condições necessárias nem recursos financeiros adicionais.
Neste quesito, o governo Lula repete os equívocos do governo anterior. Ao pretender uma reforma, apresenta medidas isoladas e dispersas, que assim até representariam avanços, mas que são neutralizadas por omissões e recuos na política educacional implementada e, ao não darem respostas satisfatórias aos problemas apresentados, os aprofundam ainda mais.
O sentido da “inovação”
A questão é saber como, nas atuais circunstâncias, repercutirão para dentro das escolas as “inovações” que o programa sugere. Partem das alturas das concepções curriculares, sem garantir no chão da escola as condições necessárias para o currículo proposto. Ora, o programa apresentado se fundamenta nos Parâmetros Curriculares Nacionais que, não por acaso, após mais de 10 anos ficaram no papel: nas escolas ainda não se vê um tratamento às “matérias” de modo que os conteúdos curriculares estivessem integrados, promovendo uma desejável abordagem interdisciplinar; permanece a tradição das disciplinas estanques.
A imprensa noticiou ainda que a intenção do MEC fosse a de eliminar as 12 disciplinas atuais, agrupando os conteúdos curriculares em quatro grupos mais amplos, por áreas de conhecimento afins. Porém, como as aulas serão atribuídas aos professores, especialistas que são em disciplinas específicas?
Não é por acaso que os sindicatos voltaram-se a este ponto em particular, acerca da “empregabilidade” do professor, a despeito de qualquer consideração metodológica. Em tempos de contenção de recursos, isso pode se configurar em estratégia sistemática de demissões.
A proposta ainda amplia a carga horária para três mil horas, 600 horas a mais que serão destinadas a atividades de livre escolha dos alunos, sem deixar claro quem será responsável por ministrar tais atividades. Em tempos de privatização e terceirização, isso pode servir de expediente para toda espécie de “parcerias” público-privadas, em detrimento da atuação dos professores.
Mais do mesmo
A “inovação” aqui vem mal disfarçada, reforçando o grande consenso construído em torno da “pedagogia da competência”, ao conceber o processo educativo a partir do desenvolvimento de competências e habilidades, mesuráveis em níveis, aquém ou além do adequado — sobretudo porque possibilitam, a despeito da diversidade entre as escolas, comparar resultados a partir de avaliações de desempenho nacionais e padronizadas. Em resumo, da “inovação” da pedagogia oficial decorre o atual sistema de avaliação, dos mesmos discursos e práticas que se repetem, com nuances, do PT ao PSDB, de mais provinhas e provões.
A que se deve esta “resistência à inovação”, já que nada há na proposta que estivesse antes legalmente impedido de ser feito? A resposta, a mais difundida, à esquerda e à direita, num lamentável consenso, é a da (má) formação dos professores, responsabilizados assim pelo fracasso sistêmico da educação nacional.
Se as estatísticas não se alterarem, então a culpa é dos professores? Segundo deduzimos do empenho retórico dos gestores da política educacional, a “inovação” é uma questão de “mérito”; porque também aferido em provas, ele é isolado de outras variáveis que incidem sobre a escolarização. Mérito, assim, é tão somente a adesão, mais ou menos voluntária, do professor ao programa estabelecido.
Faltam, entretanto as condições para que docentes até se apropriem das orientações curriculares e as transformem em práticas de sala de aula. E se o desempenho em uma avaliação resulta em qualquer ganho pecuniário (para a escola ou para o professor), melhor é fazer com que os alunos obtenham “bons resultados” – o que não é necessariamente, o mesmo que ter aprendido. Converte-se o processo educativo em produção de resultados pré-estabelecidos, lançados nas estatísticas como “melhoria da qualidade”. A sanha em avaliar dá a tônica das políticas educacionais nos últimos 10 anos, como se a crise existisse nas estatísticas, mas não no chão da escola. A “reforma” e toda a política educacional parecem esquecer-se da escola; visam produzir resultados positivos nas avaliações e a partir delas.
Velho contraponto, ainda necessário
Paradoxalmente, o real sentido de uma reforma e da inovação no ensino seria antes atender às “velhas” reivindicações dos profissionais da educação, sem o que toda “inovação” é meramente retórica.
Qualquer experimentação pedagógica que pretenda uma abordagem interdisciplinar requer tempo para a discussão entre os professores a fim de afinar os encaminhamentos adotados, planejar o processo e sua avaliação, bem como para atualização e formação contínua. Isso também tem a ver com o grau de autonomia da escola, para que ela paute e trabalhe a partir de suas especificidades. Estas condições são de tal modo imperativo que, caso não sejam satisfeitas, toda experimentação dependerá da sorte e do acaso para vingarem em boas experiências, ou redundarão na frustração das tentativas, em equívocos quanto a concepções e encaminhamentos práticos, em práticas meramente protocolares, de repetição da cartilha adotada.
Se o projeto aposta ainda na multiplicidade de trajetórias para os alunos é necessário estabelecer um número adequado de alunos por sala de aula e, além disso, um número limite de turmas a que um professor se dedica. Essas são variáveis esquecidas nas discussões sobre qualidade do ensino, quando não são rechaçadas pela tecnocracia federal, estadual ou municipal, como se isso não tivesse influência no desempenho dos alunos.
E para tudo isto, deveríamos saltar dos atuais 4 nem 5% do PIB de investimento público em educação para o mínimo de 7, senão 10%, como preconizado no nosso Plano Nacional de Educação. A expectativa de um aumento significativo de recursos, inscrita no programa de governo de Lula em 2002, não se tornou real compromisso e ficou como uma amarga nostalgia. Possibilidades são criadas nas opções políticas adotadas e, lamentavelmente, optou-se uma “inovadora continuidade”, sem a ousadia necessária para que de fato inovássemos.
* Jeorge Luiz Cardozo - É Professor da Faculdade Dom Luiz, Graduado em Filosofia (UCSAL/2000), Especialista em Educação (UNEB/2003) e Assessor Técnico da Secretaria Municipal de Educação de Salvador.
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