Por: Edilson Silva*
Houve um tempo em que o Estado burguês era somente um comitê gestor dos negócios da burguesia, como afirmava Marx. Em tempos de crise estrutural do sistema capitalista, este Estado já não pode ser chamado apenas de comitê gestor, mas de comitê de salvação dos negócios da burguesia. E no salve-se quem puder das elites econômicas, o limite da conduta é a necessidade de manter-se vivo.
Na medida em que o metabolismo natural e inescapável do capitalismo resulta em diminuição da sua taxa de lucro, em meio a crises de superprodução cada vez mais graves, o Estado passa a cumprir cada vez mais um papel direto e imprescindível na sobrevivência dos grandes grupos econômicos.
Nesta condição, o Estado passa a ser parte ativa não só na organização do funcionamento sistêmico do capitalismo, mas passa a ser diretamente assaltado por setores empresariais, numa rapina que busca permanentemente revestir-se de legalidade. A corrupção, direta e indireta, legal e ilegal, é parte deste assalto.
Quando se discute o combate à corrupção nesta perspectiva não se está a discutir elementos de uma reprovável cultura política que se moderniza, de um suposto neopatrimonialismo presente no DNA da classe política dominante ou nas oligarquias de sempre e de agora. Logo, não se trata de se discutir um problema que se encerra na esfera moral, ou de se ter posturas udenistas, como preferem alguns. Trata-se, sim, de se ter uma postura anticapitalista no universo da gestão do Estado.
O recém-finado neoliberalismo, doutrina econômica que regeu a economia mundial até 2008 sem crítica que a fizesse refluir nas principais economias, constituiu-se numa roubalheira descarada ao patrimônio público. Um criminoso sistema de corretagem se instalou nos países vítimas desta doutrina, com leilões de privatização fazendo a farra de muitos grupos econômicos. No Brasil a privatização da Vale do Rio Doce é um bom exemplo. A ex-estatal foi vendida por valor inferior ao que seria o seu faturamento anual pouco tempo depois. Um típico caso de polícia.
Enterrado o neoliberalismo enquanto doutrina econômica ortodoxa, o Estado emerge, de novo, como mais que mero suposto regulador da economia, passando ao papel de indutor direto, investidor. Mas tanto desfazendo-se do patrimônio público quanto criando patrimônio público, lá estão os grupos econômicos assaltando os cofres públicos. É o caso agora da Usina de Belo Monte, na região de Altamira, no Pará. Um investimento que chegará a R$ 30 bilhões, cujo resultado, a se levar em conta números de empresas do próprio governo, é duvidoso em relação a impactos ambientais, lucratividade, destinação das comunidades atingidas, etc. Enquanto isso, faltam alguns milhões para se evitar os desastres como os que aconteceram no Rio de Janeiro, vitimando centenas de pessoas.
Não precisamos dizer aqui que o superfaturamento verificado nos recentes Jogos Panamericanos do Rio de Janeiro tendem a se repetir na Copa de 2014 e nos Jogos Olímpicos de 2016 aqui no Brasil. Os cofres públicos serão as vítimas mais uma vez, e por tabela, o povo pobre e as classes médias do país.
Dando sustentação a este assalto sistêmico e orgânico aos cofres públicos está algo que dá capa de legalidade a estes crimes: a falsa democracia, o regime democrático-burguês, baseado exclusivamente em eleição de representantes que aparecem de quatro em quatro anos com campanhas milionárias e muito marketing, vitimando a população, convertida em mera inocente homologadora do caos. Combater a corrupção na sua raiz, portanto, é combater os limites impostos à democracia por este regime democrático burguês, é combater o monopólio do estatuto da representatividade política para definir as prioridades orçamentárias, por exemplo.
Foi e é com esta perspectiva que o PSOL empunhou e empunha a luta contra a corrupção. Avançar no aprofundamento da democracia é condição sine qua non no combate à corrupção e consequentemente em favor da luta para que os recursos públicos sejam destinados prioritariamente ao atendimento das demandas mais sentidas e inadiáveis da maioria da população.
Portanto, a luta por Controle Social efetivo da sociedade sobre o Estado é fundamental. A participação popular direta através de referendos e plebiscitos, como já estabelece a nossa Consituição Federal, é parte desta luta. A possibilidade de destituição popular de mandatos de representantes que não correspondam ao seu eleitorado é parte desta luta também. A luta pelo fortalecimento do Ministério Público enquanto órgão independente idem. A defesa de Tribunais de Contas independentes, com conselheiros concursados e não políticos aposentados, é parte desta empreitada.
A luta conseqüente contra a corrupção é parte indissociável da necessária mobilização popular em defesa de um país melhor para a maioria da população. Nós do PSOL temos este compromisso.
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*EDILSON SILVA - Presidente do PSOL-PE e pré-candidato ao governo de Pernambuco.
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